Por Leonardo Sakamoto
Se
você forma sua opinião baseado nas milhares de correntes apócrifas que circulam
pela internet, parabéns. Você é, oficialmente, um otário. Ou quer muito ser um.
Nunca entendi muito bem
porque as pessoas acreditam piamente naquilo que recebem aleatoriamente em suas
caixas de mensagem. Será que entendemos o anonimato daquilo que é apócrifo como
uma espécie de “sinal” divino? Do tipo: “Senhor, dê-me os números vencedores do
jogo do bicho!” – e, minutos depois, você interpreta uma foto de um pug com um
chapéu de orelhas grandes, que chegou acidentalmente por e-mail, como resposta
para apostar no “coelho”.
Vai que, da mesma forma
que o Altíssimo escreve certo por linhas tortas, ele também “emeia” justo por
internet frouxa, não é?
O mais interessante é
que algumas dessas mensagens contam com mentiras tão bem construídas que tem
mais gente acreditando nelas do que em boas matérias, com dezenas de fontes,
feitas por jornalistas com decantada credibilidade, que – com paciência e
tristeza – desmentem ou explicam o caso.
- Pô, o texto é super bem escrito. Não deve ser falso.
- O e-mail trouxe vários números. Ou seja, não pode ser mentira.
- Ele tem fotos. É mais difícil manipular fotos.
- Envolve o filho do Lula/a filha do Serra, então, vai por mim, é fato.
- Recebi isso do Ronaldo, irmão da Ritinha, casada com o Roberval, filho do seu Romeu, lembra? É, Ro-meeeeeu, mano. Ele repassou um e-mail que recebeu do Rui, que é chefe dele na Ramos e Ramos, aquela empresa de retroescavadeiras. Homem decente o Ronaldo… então é coisa séria.
A rede mundial de computadores
nos abriu um mundo de possibilidades. Hoje, um leitor – se quiser – consegue
acessar fontes confiáveis e encontrar números, checar dados, trocar ideias com
amigos, comparar governos ou mesmo desmentir pataquadas. Então, mexa esse
traseiro gordo e faça uma análise dos fatos, a sua análise. Não jogue fora sua
autonomia por conta de uma mensagenzinha mequetrefe. E cuidado! Ao se debruçar
sobre questões do seu cotidiano, ao informar-se, debater com outras pessoas,
você vai estar fazendo Política, com “P” maiúsculo e não fofoca. E enterrando
muitos dos preconceitos que hoje professa. Em suma, mudando de fato o “estado
das coisas”.
Coisa que o Povo do Spam
não quer. Pois, o Povo do Spam quer você ignorante para que seja massa burra de
manobra.
Algumas mensagens de
spam travestem opinião como dados isentos e descontextualizam ou ocultam fatos
que não são interessantes para o argumento defendido. Trago novamente algumas
sugestões reunidas tempos atrás por Rodrigo Ratier, jornalista e mestre em
pedagogia, grande especialista na área de educação e comunicação, para usar a
lógica a fim de perceber problemas nos textos.
Quem já adota essas
ferramentas, pode parar a leitura por aqui e vá apagar o lixo acumulado na
caixa de entrada. Caso contrário, fica aqui a sugestão:
“A camisinha não protege contra o vírus HIV. A epidemia de Aids cresceu
justamente porque se confia nessa proteção”, disse um bispo certa vez.
Desconfie dos argumentos
de autoridade. Não é porque o Papa, o Patriarca de Istambul ou a Bispa Sônia disseram
algo que você tem que acreditar, não é? O mesmo vale para o presidente da sua
associação de moradores ou o diretor do seu sindicato. É preciso provar o que
se diz. Exija confirmação dos fatos ou vá atrás dela.
“Não ouviremos as posições do antropólogo Luiz Mott sobre o casamento
gay: ele é homossexual.”
Para desmontar um discurso, não se ataca o argumentador, mas sim o
argumento.
“Nesta eleição, vamos escolher entre um Sartre e um encanador.”
Não se ridiculariza o outro apenas por ser seu adversário.
“Antes do MST existir, não havia violência no campo.”
Falsa relação de causa e
consequência – um fato que acontece depois do outro não necessariamente foi
causado pelo primeiro.
“Na guerra contra o terrorismo, ou você apoia a invasão do Iraque ou
está alinhado com o mal.”
É errado excluir o meio
termo. Um debate maniqueísta é mais fácil de ser entendido, mas o mundo real
não é um Palmeiras e Corinthians, um Fla-Flu, um Grenal, enfim, vocês
entenderam.
“Ou se dá o peixe ou se ensina a pescar.”
Isso é uma falsa
oposição. Não se opõe curto e longo prazo necessariamente. Uma ação não
invalida a outra. Elas podem ser, inclusive, subsequentes ou coordenadas.
“Isso não é demissão. A empresa apenas avisou que precisará passar por
um redimensionamento do quadro de colaboradores.”
Não se deixe levar pelos
eufemismos. Nem por quem fala bonito. Uma pessoa pode te xingar e você, às
vezes, nem vai perceber se não se atentar para as palavras que ela escolheu.
“Avenida Faria Lima,
Águas Espraiadas, Imigrantes, Minhocão, Rodovia dos Trabalhadores: alguém aí
consegue imaginar São Paulo sem todas essas obras feitas pelo Maluf?”
Desconfie dos e-mail que
contém um monte de acertos de alguém e ignorem, solenemente, os erros.
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