Por Leandro Severo
Em momentos cruciais
para o país se inclinaram para o golpismo e a traição aos interesses nacionais.
Em 1941, enquanto
milhões de homens e mulheres derramavam seu sangue pela liberdade nos campos da
Europa e da União Soviética, a elite dos círculos financeiros dos Estados
Unidos já traçava seus planos para o pós-guerra. Como afirmou Nelson
Rockefeller, filho do magnata do petróleo John D. Rockefeller, em memorando que
apresentava sua visão ao presidente Roosevelt: “Independente do resultado da
guerra, com uma vitória alemã ou aliada, os Estados Unidos devem proteger sua
posição internacional através do uso de meios econômicos que sejam
competitivamente eficazes...”. Seu objetivo: o domínio do comércio mundial,
através da ocupação dos mercados e da posse das principais fontes de
matéria-prima. Anos mais tarde o ex-secretário de imprensa do Congresso estadunidense,
Gerald Colby, sentenciava sobre Rockefeller: “no esforço para extrair os
recursos mais estratégicos da América Latina com menores custos, ele não
poupava meios”.
Neste mesmo ano, Henry
Luce, editor e proprietário de um complexo de comunicações que tinha entre seus
títulos as revistas Time, Life e Fortune, convocou os estadunidenses a “aceitar
de todo o coração nosso dever e oportunidade, como a nação mais poderosa do
mundo, o pleno impacto de nossa influência para objetivos que consideremos
convenientes e por meios que julguemos apropriados”. Ele percebeu, com clareza,
que a união do poder econômico com o controle da informação seria a questão
central para a formação da opinião pública, a nova essência do poder nacional e
internacional.
Evidentemente para que
os planos de ocupação econômica pelas corporações americanas fossem alcançados
havia uma batalha a ser vencida: Como usurpar a independência de nações que
lutaram por seus direitos? Como justificar uma postura imperialista do país que
realizou a primeira insurreição anticolonial?
A resposta a esta
pergunta foi dada com rigor pelo historiador Herbert Schiller: “Existe um
poderoso sistema de comunicações para assegurar nas áreas penetradas, não uma
submissão rancorosa, mas sim uma lealdade de braços abertos, identificando a
presença americana com a liberdade – liberdade de comércio, liberdade de
palavra e liberdade de empresa. Em suma, a florescente cadeia dominante da
economia e das finanças americanas utiliza os meios de comunicação para sua
defesa e entrincheiramento onde quer que já esteja instalada e para sua
expansão até lugares onde espera tornar-se ativa”.
Foi exatamente ao que
seu setor de comunicações se dedicou. Estava com as costas quentes, já que as
agências de publicidade americanas cuidavam das marcas destinadas a substituir
as concorrentes europeias arrasadas pela guerra. O setor industrial dos EUA
havia alcançado um vertiginoso aumento de 450% em seu lucro líquido no período
1940-1945, turbinado pelos contratos de guerra e subsídios governamentais. Com
esta plataforma invadiram a América Latina e o mundo.
Com o suporte do
coordenador de Assuntos Interamericanos (CIIA), Nelson Rockefeller, mais de mil
e duzentos donos de jornais latinos recebiam, de forma subsidiada, toneladas de
papel de imprensa, transportada por navios estadunidenses. Além disso, milhões de
dólares em anúncios publicitários das maiores corporações eram seletivamente
distribuídos. É claro que o papel e a publicidade não vinham sozinhos, estavam
acompanhados de uma verdadeira enxurrada de matérias, reportagens, entrevistas
e releases preparadas pela divisão de imprensa do Departamento de Estado dos
EUA.
A vontade de conquistar
as novas “colônias” e ocupar novos territórios como haviam feito no século
anterior, no velho oeste, não tinha limites. No Brasil, circulava desde 1942, a
revista Seleções (do Reader’s Digest), trazida por Robert Lund, de Nova York. A
revista, bem como outras publicações estrangeiras, pagavam os devidos direitos
aduaneiros por se tratarem de produtos importados, mas solicitou, e foi
atendida pelo procurador da República, Temístocles Cavalcânti, o direito de ser
editada e distribuída no Brasil, com o argumento de ser uma revista sem
implicações políticas e limitada a publicar conteúdos culturais e científicos.
Assim começou a tragédia.
Logo chegou o grupo
Vision Inc., também de Nova York, com as revistas Dirigente Industrial,
Dirigente Rural, Dirigente Construtor e muitos outros títulos que vinham
repletos de anúncios das corporações industriais. Um fato bastante ilustrativo
foi o da revista brasileira Cruzeiro Internacional, concorrente da Life
International, que apesar de possuir grande circulação, nunca foi brindada com
anúncios, enquanto a concorrente americana anunciava produtos que, muitas
vezes, nem sequer estavam à venda no Brasil.
Ficava claro que os
critérios até então estabelecidos para o mercado publicitário, como tempo de
circulação efetiva, eficiência de mensagem e comprovação de tiragem, de nada
adiantavam. O que estava em jogo era muito maior.
Um papel importantíssimo
na ocupação dos novos mercados foi desempenhado pelas agências de publicidade
americanas. McCann-Erickson e J. Warter Thompson eram as principais e tinham
seu trabalho coordenado diretamente pelo Departamento de Estado. Para se ter
uma ideia a McCann-Erickson , nos anos 60, possuía 70 escritórios e empregava
4619 pessoas, em 37 países, já a J. Warter Thompson tinha 1110 funcionários,
somente na sede de Londres. Os Estados Unidos tinham 46 agências atuando no
exterior, com 382 filiais. Destas 21 agências em sociedade com britânicos, 20
com alemães ocidentais e 12 com franceses. No Brasil atuavam 15 agências, todas
elas com instruções absolutamente claras de quem patrocinar.
No início dos anos 50,
Henry Luce, do grupo Time-Life, já estava luxuosamente instalado em sua nova
sede de 70 andares na área mais nobre de Manhattan, negócio imobiliário que
fechou com Nelson Rockefeller e seu amigo Adolf Berle, embaixador estadunidense
no Brasil na época do primeiro golpe contra o presidente Getúlio Vargas. Luce
mantinha fortes relações com os irmãos Cesar e Victor Civita, ítalo-americanos
nascidos em Nova Iorque. Cesar foi para a Argentina em 1941 onde montou a
Editorial Abril, como representante da companhia Walt Disney, já Victor, em
1950, chega ao Brasil e organiza a Editora Abril. Neste mesmo período seu filho,
Roberto Civita, faz um estágio de um ano e meio na revista Time, sob a tutela
de Luce e logo retorna para ajudar o pai.
Poucos anos depois, o
mercado editorial brasileiro está plenamente ocupado por centenas de
publicações que cantavam em prosa e verso o american way of life. Somente a
Abril, financiada amplamente pelas grandes empresas americanas, edita diversas
revistas: Claudia, Quatro Rodas, Capricho, Intervalo, Manequim, Transporte
Moderno, Máquinas e Metais, Química e Derivados, Contigo, Noiva, Mickey, Pato
Donald, Zé Carioca, Almanaque Tio Patinhas, a Bíblia Mais Bela do Mundo, além
de diversos livros escolares.
Em 1957, uma Comissão
Parlamentar de Inquérito da Câmara dos Deputados, comprova que “O Estado de São
Paulo”, “O Globo” e “Correio da Manhã” foram remunerados pela publicidade
estrangeira para moverem campanhas contra a nacionalização do petróleo.
Em 1962, o grupo
Time-Life encontra seu parceiro ideal para entrar de vez no principal ramo das
comunicações, a Televisão. A recém-fundada TV Globo, de Roberto Marinho. Era
uma estranha sociedade. O capital da Rede Globo era de 600 milhões de
cruzeiros, pouco mais de 200 mil dólares, ao câmbio da época. O aporte dado
“por empréstimo” pela Time-Life era de seis milhões de dólares e a empresa
tinha um capital dez mil vezes maior.
Como denunciou o
deputado João Calmon, presidente da Abert (Associação Brasileira de Empresas de
Rádio e Televisão): “Trata-se de uma competição irresistível, porque além de
receber oito bilhões de cruzeiros em doze meses, uma média de 700 milhões por
mês, a TV Globo recebe do Grupo Time-Life três filmes de longa metragem por dia
– por dia, repito... Só um ‘package’, um pacote de três filmes diários durante
o ano todo, custa na melhor das hipóteses, dois milhões de dólares”.
O Brasil e o mundo estão
em efervescência. A tensão é crescente com revoluções vitoriosas na China e em
Cuba. A luta pela independência e soberania das nações cresce em todos
continentes e os EUA colocam em marcha golpes militares por todo o planeta. A
Guerra Fria está em um ponto agudo.
É nesse quadro que a
Comissão de Assuntos Estrangeiros do Congresso dos EUA, em abril de 1964, no
relatório “Winning the Cold War. The O.S. Ideological Offensive” define:
“Por muitos anos os
poderes militar e econômico, utilizados separadamente ou em conjunto, serviram
de pilares da diplomacia. Atualmente ainda desempenham esta função, mas o
recente aumento da influência das massas populares sobre os governos, associado
a uma maior consciência por parte dos líderes no que se refere às aspirações do
povo, devido às revoluções concomitantes do século XX, criou uma nova dimensão
para as operações de política externa. Certos objetivos dessa política podem
ser colimados tratando-se diretamente com o povo dos países estrangeiros, em
vez de tratar com seus governos. Através do uso de modernos instrumentos e
técnicas de comunicação, pode-se hoje em dia atingir grupos numerosos ou
influentes nas populações nacionais – para informá-los, influenciar-lhes as
atitudes e, às vezes, talvez, até mesmo motivá-los para uma determinada linha
de ação. Esses grupos, por sua vez, são capazes de exercer pressões notáveis e
até mesmo decisivas sobre seus governos”.
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