Por Luciano Martins Costa
Os três principais
jornais genéricos de circulação nacional saíram na quinta-feira (30/5) com a
mesma manchete, todos eles induzindo o leitor a acreditar que o Brasil se
encontra à beira do abismo.
- “PIB decepciona, mas BC eleva juros para conter a inflação”, diz o Estado de S.Paulo.
- “PIB decepciona, mas BC aumenta juros ainda mais”, ecoa a Folha de S.Paulo.
- Numa linguagem mais popular, o Globo anuncia: “Nem Pibinho segura juros, que vão a 8%”.
O ponto de partida para
a interpretação catastrofista é mais um resultado frustrante do Produto Interno
Bruto, que cresceu 0,6% no primeiro trimestre deste ano, na comparação com o mesmo
período de 2012. O contraponto é a decisão do Banco Central de elevar a taxa de
juros em 0,5 ponto porcentual, surpreendendo previsões da maioria dos analistas
credenciados pela imprensa, que esperavam uma taxa de 0,25 ponto porcentual.
Mas há algumas
interpretações conflitantes e nem todas sustentam o viés catastrofista indicado
pelas manchetes. Por exemplo, a melhoria da produtividade da agropecuária fez o
setor crescer 9,7% no período, o melhor resultado em cinco anos. O resultado
aponta para menos pressão sobre os preços de alimentos nos próximos meses,
segundo algumas análises.
As safras dos principais
produtos superaram expectativas: a soja, que tem grande peso na cesta da
produção rural, tem uma safra 23,3% maior que a do mesmo trimestre de 2012, sem
que tenha sido necessário expandir na mesma proporção a área cultivada, o mesmo
acontecendo com o arroz e o milho, gerando uma produção recorde de 185 milhões
de toneladas de grãos em 2013. A produção de cana deve crescer mais de 100% no
período até junho.
Há um claro descompasso
entre a interpretação induzida pelas manchetes e algumas reportagens e análises
apresentadas internamente pelos jornais. Interessante observar que o viés
negativo é mais acentuado nos comentários de jornalistas não especializados,
principalmente colunistas que normalmente se dedicam a temas políticos. Em
alguns casos, como no da Folha de S.Paulo, o tom chega a ser triunfalista em
seu negativismo, como se fosse o caso, em qualquer circunstância, de comemorar
as dificuldades da economia nacional.
Festejando o desastre
Esse descompasso fica
mais claro quando se lê com atenção as reportagens internas, entre as quais se
registra, por exemplo, um aumento de 4,6% nos investimentos totais na economia,
no primeiro trimestre deste ano, em relação ao último trimestre de 2012, o que
pode apontar a possibilidade de interrupção da série negativa de desempenho da
indústria.
Quanto ao PIB, os
gráficos que têm como ponto comparativo inicial o ano de 2011, quando houve uma
queda acentuada na produção de riqueza, mostram que o ponto mais baixo do
“vale” ficou no terceiro trimestre daquele ano, quando o PIB ficou negativo em
0,1%.
Nos gráficos que
abrangem um período maior de tempo, o olhar sobre esse indicador mostra o
desenho de uma curva segundo a qual a economia brasileira vem se recuperando
gradualmente desde meados de 2012, após um período de estagnação no começo
daquele ano.
Embora lenta, há uma
retomada neste começo de 2013, e as comparações lineares entre o final do ano
anterior e os três meses iniciais deste ano não podem ser consideradas a sério
se não levarem em conta as variações sazonais do consumo e o costumeiro desaquecimento
do primeiro trimestre.
Finalmente, o gráfico
comparativo entre as economias de outros países mostra o Brasil no grupo
daqueles com melhor resultado, com um desempenho semelhante ao dos Estados
Unidos, inferior à evolução da Coreia do Sul e Japão e superior ao crescimento
do México, Inglaterra, Alemanha, França e resto da Europa.
Portanto, há muitas
maneiras de interpretar os dados disponíveis.
A oscilação do nível de
geração de riqueza se deve, em grande parte, ao esfriamento do consumo, que pode
ser atribuído a muitas causas, entre as quais se deve incluir o estado ânimo
dos consumidores, algumas altas de preços pontuais, os juros e a sazonalidade
de alguns produtos que vinham puxando a economia.
Toda interpretação de
dados econômicos e sociais é feita a partir de um recorte específico, e os
jornalistas sabem, de antemão, que cada analista vai estar olhando apenas uma
fatia do bolo. A escolha de manchetes equilibradas ou catastrofistas é uma
decisão editorial, que não contempla necessariamente a realidade objetiva.
Não há como fugir à evidência de que, diante de
um copo sobre a mesa, a imprensa tem a tendência de enxergá-lo mais vazio do
que cheio.
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