Entrevista de Paulo Henrique Amorim com Aloysio Castelo de Carvalho
Em 1954 como hoje o tema
da corrupção escondia o principal: de quem é o petróleo ? Nosso ou da Chevron ?
PHA – Eu converso com o professor Aloysio Castelo de Carvalho, que
acaba de lançar o livro: “Caso Última Hora”. Ele também lançou recentemente o
”Rede da Democracia - O Globo, O Jornal e o Jornal do Brasil na queda do
governo Goulart”. Professor Aloysio Castelo
de Carvalho, se o senhor pudesse resumir a tese do seu livro, “O Caso Última
Hora”, por favor:
Aloysio: O Caso Última
Hora surge como contrapartida à campanha em favor da Petrobras.
A campanha contra a
“Última Hora” é uma campanha contra o Governo Getúlio Vargas. Contra as
propostas, contra o projeto do Governo Vargas que o jornal “Última Hora”
apoiava.
É uma campanha contra
esse modelo de desenvolvimento em bases nacionalistas, que dá ênfase ao Estado.
Formalmente, a questão da “Última Hora” surge do apoio financeiro do Estado à
criação do jornal “Última Hora” de
Samuel Wainer, em 1961.
Mas, a questão política
que esta por trás é uma campanha contra o Governo, contra Vargas, contra o
projeto dele de Estado e de sociedade.
PHA – E o centro dessa campanha (contra Vargas) é (a política d)o
“Petróleo é Nosso”?
Aloysio – Sim. “O
Petróleo é Nosso” é uma campanha que mobilizou a opinião pública; é a maior
campanha política da História do Brasil.
E ela teve um impacto
muito grande na UDN, no meio militar e sindical.
Que tipo de impacto?
Desestruturou a UDN, que passou a apoiar a proposta de Vargas. A UDN nesse
momento teve uma crise de representatividade.
Ela (a campanha)
mobiliza os militares, ela politiza o ambiente militar – o que nunca é bom para
os setores liberais de direita. E também ela estimula os sindicatos e os
trabalhadores a participar da discussão sobre o modelo de desenvolvimento.
Então, esse impacto da
campanha da Petrobras, que coloca em discussão para toda a sociedade que tipo
de modelo de Estado, que tipo de modelo de desenvolvimento tem sua
contrapartida na campanha contra a “Última Hora”, que é centrada no tema da
corrupção.
Então, a campanha contra
a “Última Hora” é uma campanha que esvazia o debate político e conseguiu hegemonizar,
porque a imprensa liberal daquela época hegemonizava a informação.
PHA – Quem eram os principais inimigos de Vargas? Ou e portanto da
“Última Hora”?
Aloysio – O primeiro é o
Lacerda. Começa com o Lacerda. Ele tinha posições extremadas. O Lacerda desde
que Vargas assume a presidência ele não aceita a vitória de Vargas.
Os setores liberais,
conservadores, Lacerda, parte da imprensa, o (jornal) “O Estado de S. Paulo” e
os demais, não aceitam a volta de Vargas pelas eleições.
Na visão desses setores liberais
havia uma disfunção da democracia – como pode um ditador em 37 voltar pelas
eleições diretas?
Então eles não aceitam,
e aí já tentam barrar a posse de Vargas.
“O Globo” e o
Chateaubriand aceitam a posse (de Vargas). Mas vão cerrar a oposição aí (na
questão do Petroleo é Nosso) e se aproveitam do tema da corrupção, que surge
ali com (o empréstimo à) a “Última Hora” .
Porque a corrupção é o
tema central ali, da oposição.
PHA – O senhor já escreveu sobre a Rede que se montou para derrubar o
Jango. Agora o senhor escreve sobre a “Última Hora” e a Petrobras. Isso não
inspira o senhor a escrever sobre os dias de hoje?
Aloysio – Inspira. Eu
estou me voltando agora para o tema que é o regime militar de 64 até a
liberalização política do Geisel.
Hoje já está ficando
mais claro para a opinião pública que o projeto de liberalização do governo
militar era um projeto autoritário. Um projeto de continuidade.
A Comissão da Verdade
esta aí deixando público que os presidentes militares apoiavam a tortura.
E durante esse tempo
todo jornais como “O Globo” apoiavam esses presidentes.
Nós temos que esclarecer
essas conexões da imprensa com a ditadura militar, esse é meu foco agora.
PHA – Então, o senhor vai se contrapor frontalmente à obra política do
jornalista Elio Gaspari, que transforma os generais Geisel e Golbery nos
grandes paladinos da abertura política do país?
Aloysio – Não só o Elio
Gaspari. Nós temos a academia. Nós temos professores que defendem que o projeto
dos militares é um projeto democrático.
PHA – Quem mais além do Elio Gaspari o senhor mencionaria ?
Aloysio – Eu não queria
citar nomes, mas no âmbito acadêmico é muito forte essa posição de que o
projeto dos militares era um projeto de democracia.
Eles não conseguem
perceber que eles (os militares) foram derrotados por um movimento muito forte
da sociedade. Mas havia uma intenção de continuidade.
O Governo Medici é uma
época de sucesso econômico, um sucesso econômico com custos sociais enormes,
mas o Brasil se tornou a 6ª economia do mundo.
Então, os militares
viram que era uma oportunidade tentar legitimar o regime pelo campo eleitoral.
E ai foram perdendo
sucessivamente espaço e controle. Mas,
tinha um projeto autoritário de continuidade do aparelho repressivo.
A gente vê hoje um
torturador como o Ustra chegar e afrontar uma Comissão da Verdade como ele
afronta.
Isso significa o que?
Que nada foi desmontado.
Nós temos ai um aparelho
repressivo que não foi desmontado, não foi desvendado, e esse projeto todo
recebeu o apoio de setores dominantes,
liberais e conservadores da imprensa.
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