Por Luciano Martins Costa
De cada sete manchetes
dos grandes jornais brasileiros ao longo de cada semana, nos últimos dois
meses, cinco foram tiradas de declarações. As outras duas se referem a eventos
incontornáveis como acidentes e crimes graves, decisões políticas ou judiciais
ou, mais raramente, tratam de questões levantadas por institutos de pesquisa.
Há poucos registros, nesse período, de reportagens produzidas por meio da
investigação jornalística que tenham chegado ao topo das primeiras páginas.
O que isso significa?
Primeiro, pode-se
afirmar que o jornalismo apresentado aos leitores dos diários se transformou
numa crônica do processo dialético do poder, do qual a imprensa destaca aquilo
que lhe parece mais interessante ou conveniente.
Em segundo lugar,
deve-se registrar que o jornalismo baseado em frases tende a se afastar da
suposta objetividade, que é o fundamento de seu valor social: o jornalismo
declaratório é uma confissão de que o interesse dos jornais já não está
ancorado no mito da objetividade, mas no propósito do convencimento.
Dos três grandes jornais
considerados de circulação nacional, apenas o Globo escapa, eventualmente,
desse modelo observado. No caso do jornal carioca, o olhar mais localizado
tende a produzir mais notícias “puras”, geralmente tiradas de acontecimentos
que interessam ao público do Rio de Janeiro. No entanto, quando tratam de
questões nacionais, principalmente sobre política, todos os jornais escapam
pelo caminho fácil de colher, selecionar e destacar declarações.
Curiosamente, tais declarações
repetem um viés comum, produzindo ondas de notícias que são, na verdade,
não-notícias.
Assim acontece com a
suposta intenção do governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), de vir a se
candidatar a presidente da República em 2014. Da mesma forma, têm destaque
assegurado quaisquer construções verbais produzidas pelo senador Aécio Neves
(PSDB), cuja candidatura ao mesmo cargo é tida como certa. Com a mesma atenção
os jornais acompanham manifestações da presidente da República e do presidente
do Supremo Tribunal Federal, ministro Joaquim Barbosa.
Mas tudo são frases,
apenas frases.
Barbosa falou, Barbosa
disse.
Vamos contornar, na
medida do possível, o conteúdo preferencialmente destacado pela imprensa em
cada uma dessas manifestações, deixando um pouco de lado as declarações e
analisando o grau de objetividade da notícia em estado “puro”.
Apanhando um
acontecimento destacado pelos jornais nesta semana, sobre duas mortes ocorridas
durante a Virada Cultural em São Paulo, pode-se observar que, no primeiro
momento, a repercussão dos casos de violência foi inteiramente dirigida pela
imprensa para supostas responsabilidades da Prefeitura da capital. Essa
abordagem, mais escancarada no Estado de S.Paulo mas também assumida pela Folha
de S.Paulo, ganhou rapidamente destaque em jornais de outras regiões.
Porém, já na terça-feira
(21/5), os jornais reconhecem que as causas da violência podem ser múltiplas e
não ter relação com os locais escolhidos para os espetáculos ou o tipo de
organização adotado pela Prefeitura. O foco passou a ser uma suposta leniência
dos policiais destacados para a prevenção de conflitos e assaltos, porque eles
estariam descontentes com atrasos no pagamento do chamado “bico oficial” –
trabalho extra da Polícia Militar para eventos de outras instituições públicas.
A violência é parte da
realidade de São Paulo em qualquer contexto. A imprensa publica regularmente
estatísticas demonstrando o aumento dos casos de latrocínio, estupro e outras
formas de criminalidade extrema na capital paulista nos últimos dezoito meses.
As duas mortes ocorridas
nas grandes aglomerações produzidas no fim de semana devem ser avaliadas em
comparação com o contexto geral dos registros de ocorrências dos fins de
semana, sem Virada Cultural. Mas isso faz parte de um jornalismo com intenções
de objetividade, o que, definitivamente, não é o caso da imprensa brasileira.
Voltemos, então, ao
jornalismo declaratório, terreno onde a imprensa nacional trafega com mais
naturalidade.
O que temos de destaque
nesta semana? Mais uma declaração polêmica do presidente do STF, Joaquim
Barbosa. Ele disse, em palestra para universitários, que os partidos políticos
brasileiros são “de mentirinha” e que o Congresso Nacional é refém do
Executivo. Temos, então, uma agenda para a semana, e ela não é construída em
torno de fatos, projetos, políticas públicas ou dados econômicos: a pauta essencial da imprensa é feita de
fofocas.
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