Por Roberto
Amaral
Diz-nos o Sr. Alexandre Schwartsman, ex-diretor do
Banco Central, que “A saída [da ‘crise’] é frear a economia. É demitir mesmo”.
Dizem os ‘economistas’ midiáticos, catados a dedo pelos jornalões para
confirmarem seus editoriais, que, ‘com esse nível de emprego’ (e aí repousa o
cerne da história), a inflação vem a galope, e se é assim, a única coisa a fazer é subir os juros e promover o desemprego para que o consumo caia. Ou seja, desmontar a
política que reduziu os efeitos da crise do capitalismo internacional e
realizou a mais importante distribuição de renda conhecida entre nós. Demitir,
afastar de vez a ‘ameaça’ do pleno emprego com que sonha a sociedade sadia.
Esta é a pérola do pensamento neoliberal, reduzindo a vida da nação aos seus
índices macroeconômicos, gasto público, juros, inflação etc., donde o aumento
da taxa de juros real, produzindo menor taxa de inflação, menor PIB e maior
desemprego. Com esse programa recessivo
os economistas midiáticos vão ao orgasmo. Povo, como dizia a desterrada Zélia,
é apenas um ‘detalhe’, a política é um estorvo, as metas estratégicas, em país
que renuncia ao seu destino histórico, uma fantasia, administrada pela
tecnoburocracia financeira estatal, preparando-se para o grande salto da
gerência privada.
Se o desemprego e a fome, a insegurança e o caos social
são admissíveis, e são fenômenos puramente estatísticos para essa
tecnoburocracia, enquanto uma reles
inflação sazonal é inadmissível, aumentar o desemprego é a alternativa
que retiram de seus manuais mal-traduzidos, o cediço receituário do monetarismo
jurássico que ora destrói a Europa. A última decisão do Copom revela que a
cantilena do mercado, tonitroada pelos jornalões, voltou a impor-se no BC,
quebrando o viés de baixa inaugurado pela presidente Dilma. Sim, a questão é um
pouco mais profunda. Não se trata, apenas, do injustificado aumento de 0,25%,
mas do risco de um aumento, que poderia ser episódico, transformar-se em
tendência, por exigência da mesma ideologia que comandou o BC nas últimas
décadas.
Eis o que nos dizem: é preciso aumentar os juros, pois
é preciso diminuir o consumo, o pai e a mãe da inflação, e para diminuir o
consumo é preciso desaquecer o mercado de trabalho. O grande vilão desta feita
é ‘o crescimento do poder de renda da população’ pressionando os salários no
setor de serviços (Júlio Gomes de Almeida, ex-secretário de Política Econômica
do Ministério da Fazenda).
Mas, como amaldiçoar o consumo, se não há excesso de
demanda em relação à oferta, numa economia que no último ano cresceu miserável
0,9%, depois de haver crescido em 2011 apenas 2,7%, abaixo do crescimento médio
mundial (de um mundo em crise) de 3,9% em 2011 e 3,12% em 2012? Os economistas midiáticos que ridicularizam o
PIB de 0,9% – por eles chamado de ‘pibinho’ — vêm agora nos dizer que a
economia precisa ser esfriada! Na verdade, as pitonisas da tragédia sempre na
esquina se assustam com a perspectiva de o país crescer 3% em 2013, ainda
abaixo dos 3,1% previstos (FMI) para o crescimento mundial. Somos o único país
do mundo que não pode crescer acima de 3% a.a. e ter juros baixos. Só os nossos
monetaristas estão certos, todo o resto do mundo, como os chineses, é
incompetente. Viva a Espanha, viva Portugal, viva a Grécia, que, a despeito de
conviver com a fome de suas crianças (The New York Times International
Weekly/FSP, 29.4) anuncia mais 15 mil
demissões no serviço publico (O Globo 29.4).
Lá, naqueles países, aprofundar a recessão é o remédio
que o FMI receita para a recessão, e assim ele caminham num crescendo de
pobreza. No Brasil, para combater uma pressão de demanda que só eles vêem, os
saudosistas do FMI receitam o desemprego (leia-se, a estagnação econômica).
Mas, como falar em pressões de demanda, se a economia brasileira registra
crescimento fraco?
Bem, dirá o banqueiro, dizem os jornalões, haja ou não
excesso de demanda, há inflação, e se há inflação é preciso anular a pressão
dos salários, que crescem mais do que a produtividade.
Agora querem deter o
crescimento econômico, mínimo, repita-se sempre, para combater a inflação.
Mas de qual inflação fala o sistema financeiro, se em
nosso país ela está em queda desde o início do ano? É só conferir: janeiro,
0,86%; fevereiro, 0,60% e março, 0,47%. A inflação está em queda e a queda é
tendencial, independentemente do BC. Explica-se: o mundo é deflacionário em
commodities; os preços dos alimentos (responsáveis por 76% da inflação) começam
a cair; o governo continuará desonerando produtos, de que resulta a redução de
custos e dos preços ao consumidor, e permanecerá utilizando as importações como
um regulador de mercado. E com juros
mais baixos o governo gasta menos com o
pagamento dos juros da dívida pública.
Em artigo recente (‘Inflação’, FSP, 25.4.13) Marcelo
Miterhof demonstra que nada justifica a recente alta dos juros (que afronta uma
das principais conquistas do atual governo) para combater uma inflação
sabidamente irrelevante porque cadente e sazonal, pois decorrente: 1) da queda
da safra agrícola (mais precisamente reduziu-se a produção de alimentos em
benefício dos produtos exportáveis) associada à elevação dos preços das
commodities agrícolas no exterior, impactando os preços, sim, mas apenas temporariamente; 2) do aumento dos
fretes, decorrente principalmente das mudanças regulatórias de 2012 (restrições
à emissão de poluentes dos caminhões e limitação das jornadas dos
caminhoneiros); e 3) da desvalorização do câmbio, positiva para
competitividade, e ‘de efeitos limitados
no tempo sobre a inflação’.
De nada vale, porém,
o grito da realidade, pois a visão ideológica da banca, a serviço da
qual estão os jornalões, é insensível: os salários precisam crescer menos,
donde a elevação do desemprego, quando a nação que produz festeja um quase
pleno-emprego (5,4% da desocupação em janeiro, segundo o IBGE), talvez a mais
importante conquista de nosso povo em toda a vida republicana. Na contramão da
história, a elevação dos juros prejudica a retomada econômica (quem está
satisfeito com os 0,9%, além dos banqueiros?), gera mais despesa com juros no
governo federal e compromete o futuro do país.
A presidenta Dilma tem declarado – e para isso precisa
de nosso apoio, e uma forma de apoiá-la e combater a recidiva altista — que não
sacrificará o crescimento da economia e o desenvolvimento social (sem o que não
haverá nada, nem sociedade, nem povo, nem nação, nem país) para combater a
inflação. Mas, graças à última reunião do Copom, reconquistamos (para gáudio
dos Itaú, Bradesco, Citi e quejandos) a triste liderança do maior juro nominal
do mundo. Precisamos ajudar a presidente para que esse aumento inoportuno não
se transforme numa tendência no BC, porque o fim do padrão de juros altos
permanece sendo um dos grandes legados do atual mandato.
Ao fim e ao cabo, não há uma só justificativa para o
aumento dos juros, senão a de atender aos reclamos da banca: ganhar mais
dinheiro na ciranda financeira, mais precisamente na aplicação em títulos
públicos indexados à Selic. A conta será paga por nós, os contribuintes.
O governo Dilma precisa estar consciente da armadilha
que lhe prepara o pensamento conservador. E precisa, principalmente, reagir.
Tiro no pé
A chamada crise entre o Congresso brasileiro,
avacalhado pelo seu próprio comportamento, e o Judiciário, incensado e açulado
pelos mesmos jornalões que denigrem o Congresso, tem um agente provocador e seu
nome é ministro Gilmar Mendes, aquele
que inventou estar sendo grampeado, tentou denegrir a honra do ex-presidente
Lula e agora, em ato conscientemente injurídico, intervém, monocraticamente, em
autos de medida liminar, na pauta do
Senado, para impedi-lo de apreciar determinado projeto de lei aprovado na
Câmara. Os que hoje tanto falam em ‘respeito entre os três poderes’ escondem de
seus leitores que sempre foi um dogma do
Direito Constitucional brasileiro o respeito às deliberações interna corporis
do Congresso. A concessão da liminar constitui inominável abuso de poder. Essa
provocação do ministro Mendes, é grosseira represália a um nada, pois é um nada
a Comissão de Constituição e Justiça aceitar ‘a admissibilidade’ (sem importar
qualquer juízo de mérito) de um projeto-de-lei, polêmico ou não. Pois é apenas
isso o projeto do deputado Nazareno Fonteles: uma proposta em andamento,
seguindo o circuito determinado pelo Regimento Comum. Protesta-se contra uma
proposta parlamentar dentro do âmbito congressual, e silencia-se, silenciam os
jornalões diante da intromissão do STF pelas mãos de um de seus ministros.
Pensemos no inverso: o Congresso proibir o pleno do STF de apreciar determinado
processo.
Mas o pior de tudo é que a liminar acatada pelo
ministro Mendes foi interposta por um senador da República, e, assim, uma vez
mais, e não mais pela última vez, lamentavelmente, é o próprio Congresso,
incompetente para decidir ele mesmo suas querelas, que apela para o STF,
provoca sua ingerência, para depois chorar a dignidade perdida.
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