Por Jonas Valente,
na revista Teoria e Debate
As comunicações brasileiras são marcadas pela alta
concentração dos veículos em poucos grupos, pela presença de políticos no
controle rádios, TVs e jornais, pela produção verticalizada a partir do eixo
Rio-São Paulo, pelos caros e excludentes serviços de acesso à internet,
telefonia celular e TV por assinatura e pela subordinação dos órgãos e
autoridades aos interesses do empresariado do setor.
Esta última característica tem inúmeros exemplos na
história do país. O mais recente é o enterro, na gestão de Dilma Rousseff, da
proposta de nova lei para o setor que começou a ser elaborada no último ano do
governo Lula pela equipe comandada pelo então ministro Franklin Martins. O
“anúncio” foi feito pelo secretário executivo do Ministério das Comunicações,
Cézar Alvarez, em um seminário da revista TeleTime em fevereiro deste ano, em
Brasília.
O Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação
(FNDC) reagiu em nota pública assinada por mais de cem entidades. “A opção do
governo significa, na prática, o alinhamento aos setores mais conservadores e o
apoio à manutenção do status quo da comunicação, nada plural, nada diverso e
nada democrático. Enquanto países com marcos regulatórios consistentes discutem
como atualizá-los frente ao cenário da convergência e países latino-americanos
estabelecem novas leis para o setor, o Brasil opta por ficar com a sua, de
1962, ultrapassada e em total desrespeito à Constituição, para proteger os interesses
comerciais das grandes empresas”, declara o texto (Nota pública: governo
federal rompe compromisso com a sociedade no tema da comunicação). E apontou
para mobilizações em todo o país em torno de um Projeto de Lei de Iniciativa
Popular para pressionar o governo federal e o Congresso Nacional.
O PT seguiu o movimento e aprovou uma resolução que
conclama “o governo a reconsiderar a atitude do Ministério das Comunicações,
dando início à reforma do marco regulatório das comunicações, bem como a abrir
diálogo com os movimentos sociais e grupos da sociedade civil que lutam para
democratizar as mídias no país”. O texto também defende a proposta de um
Projeto de Lei de Iniciativa Popular a ser elaborado pelo FNDC (Democratização
da mídia é urgente e inadiável).
O apelo do partido do governo mostra a gravidade dos
obstáculos enraizados na Esplanada dos Ministérios. Estagnado por eles, o
Brasil vai na contramão de um movimento mundial que atinge países cujos
governos possuem as mais variadas linhas políticas. Tudo pelo medo de tocar nos
privilégios das empresas de comunicação. Enquanto isso, a diversidade das
culturas dos mais variados cantos do nosso território e a pluralidade de visões
de setores que não são representados nos conglomerados de mídia continuam
apartadas do principal instrumento de debate público e formação de valores das
sociedades contemporâneas.
O governo federal se ancora em uma retórica pública
frágil para escamotear a questão de fato. Sustenta o raciocínio de que o debate
central é a criação ou não de um marco regulatório, que substituiria a “escolha
livre do cidadão por meio do controle remoto”, figura metafórica tantas vezes
utilizada pela presidenta Dilma Rousseff. O marco regulatório já existe na
Constituição e nas leis que regem o setor, inclusive com normas que disciplinam
o conteúdo veiculado. Outro argumento é que o debate é “complexo”, “polêmico”,
quase impossível. No entanto, esse marco foi recentemente atualizado
parcialmente com a aprovação da nova Lei da TV Paga em 2011, inclusive com a
participação decisiva do Palácio do Planalto.
A questão não é se o marco regulatório deve ou não
existir, e sim “qual regulação se quer e a quem vai beneficiar”. E aí o medo de
contrariar os interesses dos conglomerados de mídia priva o país de uma agenda
urgente e necessária para, ao mesmo tempo, dar conta do desafio de democratizar
a mídia e atualizar o setor à luz da convergência entre TV, rádio, telefonia e
internet.
Enquanto o governo reluta em encarar essa tarefa,
continua alimentando um setor que disputa cotidianamente a agenda pública
contra a melhoria das condições de vida da população, o fortalecimento do
Estado e a ampliação dos direitos políticos, sociais, econômicos e ambientais.
País rico não é apenas um país sem miséria, mas também uma nação com democracia
plena, inclusive nos meios de comunicação.
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