Pular para o conteúdo principal

O petróleo é nosso: pela anulação da 11ª rodada de leilões da ANP

Por Ivan Valente
Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados,
A realização da 11ª Rodada de Licitações de Blocos Exploratórios, organizada pela Agência Nacional de Petróleo (ANP), e que está prevista para os dias 14 e 15 de maio de 2013, poderá se configurar no maior ato entreguista da história recente do país. Este novo leilão representa, a um só tempo, uma grave ameaça à soberania energética do país e uma dilapidação das riquezas nacionais, por meio da entrega ao capital privado nacional e multinacional de uma enorme quantidade das reservas nacionais de petróleo.
Se esse passo for dado, estaremos assistindo ao aprofundamento da desnacionalização do petróleo brasileiro, com a entrega para as mãos privadas, inclusive para o capital externo, de parte expressiva desta que é uma riqueza estratégica para o desenvolvimento nacional.
Os números que envolvem esta 11ª Rodada de Licitações de Blocos Exploratórios são alarmantes e já renderam inúmeras denúncias por parte das entidades representativas dos trabalhadores petroleiros em todo o Brasil. O que tem contrastado com o silêncio cúmplice do governo brasileiro, da diretoria da Petrobras e da ANP, que são os verdadeiros promotores desta nova rodada entreguista e antinacional.
Eis aqui alguns dados, publicados pela FUP – Federação Única dos Petroleiros, Sindipetro RJ e outras entidades, sobre esta 11ª Rodada de Licitações do petróleo:
- A ANP leiloará 289 blocos exploratórios, em todo o Brasil, sendo 123 em terra e 166 no mar. As áreas escolhidas estão distribuídas em 11 bacias sedimentares (localizadas nas regiões Norte e Nordeste, além do Estado do Espírito Santo), abrangendo as cidades de Barreirinhas, Ceará, Espírito Santo, Foz do Amazonas, Pará-Maranhão, Parnaíba, Pernambuco-Paraíba, Potiguar, Recôncavo, Sergipe-Alagoas e Tucano;
- Em nove rodadas de licitações (a oitava foi cancelada), realizadas desde 1999, a ANP privatizou cerca de 280 blocos, beneficiando 75 empresas privadas. Metade delas é constituída por multinacionais que atuam no Brasil, terceirizando a exploração e produção de petróleo, tornando mais precárias as condições de trabalho e expondo trabalhadores, comunidades e o meio ambiente a riscos constantes. Até o encerramento do prazo de inscrição para a 11ª Rodada, em 26/03, mais de 60 empresas, egressas de 15 países, haviam apresentado a documentação exigida.
- Segundo estimativas da superintendente da ANP, Eliane Petersohn, acredita-se que os 289 blocos ofertados possam conter “um volume de 30 bilhões de barris de óleo in situ (volume de óleo ou gás em uma determinada região, cuja extração depende de fatores de recuperação e que não pode ser entendido como reserva) nas bacias da Margem Equatorial, além de cinco bilhões na Bacia do Espírito Santo e 1,7 bilhão nas bacias maduras”. Como a média mundial de recuperação de óleo in situ varia entre 20 e 25%, o volume recuperável contido nos blocos seria de, pelo menos, 7 bilhões de barris. O equivalente a metade das reservas brasileiras reconhecidas, que, atualmente, somam 14 bilhões de barris.
- Por outro lado, para terem o direito de explorar o petróleo da União, considerando a hipótese otimista de um ágio de 500% sobre os lances mínimos de cada um dos 289 blocos integrantes da 11ª Rodada de Licitações, a arrecadação obtida pela ANP com os bônus pagos pelas empresas participantes do leilão poderia chegar a um máximo de R$ 3,7 bilhões. Os recursos que entram por meio dos leilões pouco representarão na contabilidade da Petrobras. Por isso o que a ANP está fazendo, na prática, é vender um bilhete premiado para a livre exploração da iniciativa privada;
Enquanto isso, o “negócio” é motivo de comemoração para a Diretora-Geral da ANP, Magda Chambriard, que durante Seminário realizado no dia 18 de março, em Copacabana, no Rio, declarou que “a rodada vai oferecer excelentes oportunidades para empresas de origem nacional e estrangeira, de todos os portes, interessadas em atuar no Brasil”. Ora, como não poderia representar uma excelente oportunidade? Essa é uma marca do Governo Dilma: grandes negócios para grandes empresários, um jogo de acomodação de interesses privados com o patrimônio do país que atinge portos, aeroportos, estradas e até a saúde pública.
Enquanto os governadores e o Congresso Nacional discutem a divisão dos royalties do petróleo, que representam, na melhor das hipóteses, 10% da produção da indústria de petróleo no país, os outros 90% estão sujeitos a serem entregues de mãos beijadas para o capital multinacional. Como diria Marx, “a tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo sobre o cérebro dos vivos.” Não se esperava que o privatismo dos anos 90 fosse agora voltar, mas vemos que a era FHC espreita Dilma com muito orgulho.
Muito obrigado.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O mundo como fábula, como perversidade e como possibilidade: Introdução geral do livro "Por uma outra globalização" de Milton Santos

Por Milton Santos Vivemos num mundo confuso e confusamente percebido. Haveria nisto um paradoxo pedindo uma explicação? De um lado, é abusivamente mencionado o extraordinário progresso das ciências e das técnicas, das quais um dos frutos são os novos materiais artificiais que autorizam a precisão e a intencionalidade. De outro lado, há, também, referência obrigatória à aceleração contemporânea e todas as vertigens que cria, a começar pela própria velocidade. Todos esses, porém, são dados de um mun­do físico fabricado pelo homem, cuja utilização, aliás, permite que o mundo se torne esse mundo confuso e confusamente percebido. Explicações mecanicistas são, todavia, insuficientes. É a maneira como, sobre essa base material, se produz a história humana que é a verdadeira responsável pela criação da torre de babel em que vive a nossa era globalizada. Quando tudo permite imaginar que se tornou possível a criação de um mundo veraz, o que é imposto aos espíritos é um mundo de fabulações, q...

Preços de combustíveis: apenas uma pequena peça da destruição setorial

Por José Sérgio Gabrielli Será que o presidente Bolsonaro resolveu dar uma reviravolta na sua política privatista e voltada para o mercado, intervindo na direção da Petrobras, demitindo seu presidente, muito ligado ao Ministro Guedes e defensor de uma política de mercado para privatização acelerada e preços internacionais instantâneos na companhia? Ninguém sabe, mas que a demissão do Castello Branco não é uma coisa trivial, com certeza não é. A ação de Bolsonaro, na prática, questiona alguns princípios fundamentais da ideologia ultraneoliberal que vinha seguindo, como o respeito à governança das empresas com ações negociadas nas bolsas, a primazia do privado sobre o estatal e o abandono de intervenções governamentais em assuntos diretamente produtivos. Tirar o presidente da Petrobras, por discordar da política de preços, ameaça o programa de privatizações, pois afasta potenciais compradores de refinarias e tem um enorme efeito sobre o comportamento especulativo com as ações da Petrob...

Brasil perde um dos seus mais importantes cientistas sociais

Por Ricardo Cavalcanti-Schiel Faleceu por volta das 21:30 do dia 26 de março de 213, vítima de um acidente de trânsito no Km 92 da Rodovia Bandeirantes, o diretor do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp, Prof. Dr. John Manuel Monteiro, quando regressava da universidade para sua residência em São Paulo. Historiador e antropólogo, John Monteiro foi um pioneiro na construção do campo temático da história indígena no Brasil, não apenas produzindo uma obra analítica densa e relevante, como também criando e estimulando a abertura de espaços institucionais e de interlocução acadêmica sobre o tema. Não seria exagerado dizer que foi em larga medida por conta do seu esforço dedicado que esse campo de estudos foi um dos que mais cresceu no âmbitos das ciências humanas no país desde a publicação do seu já clássico “Negros da Terra: Índios e Bandeirantes nas Origens de São Paulo” (1994) até o momento. Tendo tido toda sua formação acadêmica nos Estados Unidos (graduado pelo Col...