Por Delfim Netto
O Comitê de Política Monetária (Copom) decidiu por 6
votos a 2, na quarta-feira 17, elevar a taxa Selic para 7,50%, um aumento menor
do que se esperava no mercado financeiro. A justificativa é de que era preciso
“dar uma resposta” à inflação persistente, ponderando – segundo os termos do
comunicado da reunião – “que incertezas internas e, principalmente, externas
cercam o cenário prospectivo para a inflação e recomendam que a política
monetária seja administrada com cautela”.
Vai ser preciso aguardar a divulgação, na próxima semana,
da ata dessa reunião para conhecer mais amplamente as razões que levaram a
maioria dos membros do Copom a entender que esse era o momento para sinalizar o
início de um aperto monetário como forma de conter as expectativas de alta da
inflação. A autoridade monetária tem recomendado paciência e precaução,
enquanto procura ter uma visão melhor das incertezas, o que lhe dará conforto
para agir diante dos prováveis custos sociais da medida. A justificada cautela
tem sido confundida como leniência no combate ao processo inflacionário e, o
que é pior, como uma possível falta de apoio político para fazer o que crê que
deva ser feito.
Uma leitura mais atenta do último Relatório de Inflação
(março 2013) mostra que o Banco Central tem uma visão mais complexa do nosso
processo inflacionário e sabe que o seu controle efetivo e definitivo está fora
do seu alcance sem o apoio de sólida política fiscal e a aprovação pelo
Congresso de medidas que aperfeiçoem as instituições e deem suporte: 1. À
superação dos mecanismos protetores de grupos privados com poder de mercado
maior do que o razoável; 2. À redução dos benefícios exagerados de que se
apropriaram os servidores públicos que controlam Brasília.
É preciso reconhecer que, nos últimos 14 anos, a taxa
média de inflação anual foi de 6,36%, namorando o seu limite superior. O fato
curioso é que a inflação mesmo tão alta durante tanto tempo foi bem suportada
pelo setor financeiro, enquanto a taxa de juro real anual era de 7% ou 8%.
Agora, com a taxa de juro real de 2%, ela parece insuportável.
A verdade é que o magnífico plano de estabilização que
criou o real nunca entregou o que prometeu: uma inflação civilizada e estável
entre 2% a 3% ao ano e a recuperação de um crescimento mais robusto de 5% a 6%.
O culpado, obviamente, não foi o plano. Foi a indisposição dos sucessivos
governos de prosseguirem a sua execução. A estabilização foi vítima do seu
imenso sucesso inicial.
Não é razoável continuar a aceitar pacificamente aquela
inflação, ainda mais quando acompanhada de um crescimento médio do PIB da ordem
de 2,97%. É importante que se aprofunde a discussão de como reduzi-la, ao mesmo
tempo que se aumenta o crescimento econômico. Isso está longe de ser conseguido
apenas pela manipulação da taxa de juros real, e o governo reconhece. Seus
programas, quando maturarem em dois ou três anos, produzirão importantes
efeitos estruturais e um aumento da competitividade.
A consciência da autoridade monetária sobre a
complexidade do nosso problema inflacionário é claramente revelada em um
apêndice daquele relatório que analisa evidências sobre a relação entre salário
e inflação no Brasil, onde se conclui que reajustes salariais acima dos ganhos
de produtividade tendem a gerar pressões inflacionárias. Em outras palavras, se
desejamos reduzir a inflação sem aumentar o desemprego é preciso moderar os
aumentos salariais aos da produtividade do trabalho.
Não é possível descartar a hipótese de que a inflação,
potencialmente, retroalimenta a dinâmica dos salários por meio de mecanismos
normais e informais de indexação (ainda que, aparentemente, não se tenha feito
um teste da direção de causalidade).
Os aumentos salariais incompatíveis com a reposição da
inflação e com o crescimento do PIB per capita têm impacto significativo e
persistente no comportamento dos preços, particularmente no setor de serviços.
A propagação das pressões inflacionárias oriundas do
mercado de trabalho depende da postura da política monetária. Em outros termos,
essa deve impedir, pelo aumento da taxa de juro real, a criação de um viés
inflacionário.
É tempo de flexibilizarmos o mercado de trabalho sem
violar os direitos constitucionais dos trabalhadores, se quisermos ter no longo
prazo uma taxa de inflação civilizada e um crescimento mais robusto.
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