Por Murilo Silva,
editor do Conversa Afiada
O Centro Acadêmico XI da Escola de Direito do Largo São
Francisco promoveu nesta segunda-feira (11) um debate sobre a “Regulamentação
da Mídia”.
Participaram o professor de Direito da PUC-SP e
colunista da Carta Capital, Pedro Serrano; o professor titular da ECA, José
Coelho Sobrinho; a diretora-executiva do Centro de Mídia Alternativa Barão de
Itararé, Renata Mieli e o jornalista Paulo Henrique Amorim.
O primeiro a falar à plateia de estudantes e
professores foi Serrano, que fez
uma ampla análise das diferenças entre
Liberdade de Expressão e Liberdade de Imprensa.
Segundo ele, a Liberdade de Expressão é um princípio,
que se limita no confronto natural com outros princípios. Ele dá como exemplo a
Lei do Fumo, onde o princípio da liberdade se confronta com o princípio da
saúde pública, e, nesse embate, se encontra um equilíbrio.
Já a Liberdade de Imprensa é uma garantia
constitucional, “é a garantia de informar e sobretudo a garantia de a sociedade
de ser informada”: “essa, sim, tem de ser regulada”, diz ele.
E informar, disse ele, é informar de forma verdadeira.
Para o professor Serrano, a regulação deve se dar na
indústria da comunicação e, não, no conteúdo propriamente dito. Nessa matéria,
ele qualifica a Constituição de 1988 com “um terror”.
De acordo com Serrano, os contratos de rádio-difusão
deveriam ser licitados. “Por que a família Marinho e não outra família?”
Deveria haver uma licitação, com isonomia, como em
qualquer concorrência publica.
A radio-difusão no Brasil é estatal – o Estado é o dono
do espaço limitado de radio-frequência. Nos Estados Unidos e na Inglaterra, a
radio-frequência opera no sistema de “utility”: de propriedade privada, com
observância do Estado.
A Constituição brasileira prevê que esses contratos
sejam renovados “automaticamente”, sendo cassados, apenas, com 2/3 dos votos do
Parlamento: “isso não é um contrato é uma capitania hereditária”, completa. “É
medieval”, ele disse.
Sobre os veículos impressos que, segundo ele, estão na
esfera do privado – não dependem de concessão pública – também demonstram
graves distorções de mercado. Para Serrano, o governo não pode obrigar ou
controlar a atividade da imprensa escrita, mas pode incentivar novos
empreendimentos que favoreçam a pluralidade no mercado editorial, e sobretudo,
pode e deve combater o monopólio: “a revista Carta Capital, por exemplo, é
distribuída por uma empresa da Editora Abril, que controla a distribuição de
revistas. Não é à toa que uma edição da Carta que tratava do Carlinhos
Cachoeira não chegou a Goias”.
“Penso que o CADE [Conselho Administrativo de Defesa
Econômica - órgão responsável por garantir a concorrência nos mercados] poderia
facilmente tratar disso se quisesse.”
Serrano revelou que ajudou Sergio Motta, ministro de
Fernando Henrique Cardoso, a redigir um projeto de Comunicação de Massa que
tinha as seguintes características – clique aqui para ler “Ley de Medios ? Por
que não a do FHC ?”:
– proibia o monopólio; quem tem tevê não pode ter
jornal; limitação do direito de a rede central determinar a programação
regional; e estimulava a atividade privada.
O Estado não pode intervir na imprensa escrita, mas
pode criar mecanismos para fomentar novas industrias – como faz em todos os
outros setores da Economia, lembrou Serrano.
A regulação da mídia não tem nada a ver com censura.
Regular a mídia é uma “questão banal”, ele enfatizou. Todo mundo regula.
Renata Mielli, do Barão de Itararé, concorda em que a
“concentração do mercado” é danosa e deve ser combatida, mas vai além. Para
ela, a regulamentação deve, sim, tratar de conteúdo, a posteriori, e chamar as
empresas à responsabilidade; sobretudo no que diz respeito à classificação
indicativa de programação – dispositivo que discrimina a faixa etária adequada.
Ela relembrou o caso de um estupro, ao vivo, no Big
Brother, conforme denuncia inicial da vitima.
Renata denunciou a “judicialização” da questão. Por
conta da omissão do Congresso em regulamentar os dispositivos constitucionais –
que vem desde 1988: “a bola esta cada
vez mais com o Judiciário, em especial com o STF”.
Clique aqui para ler sobre as ADINs do professor
Comparato, que entrou no Supremo para punir o Congresso por omissão diante dos
capítulos da Constituição que tratam da Comunicação.
Renata Mielli ainda enumera pontos importantes que
esperam por decisão do Supremo – entre eles, a própria classificação indicativa
por idade.
Quatro juízes já votaram contra a classificação –
inclusive o ex-presidente Ayres Britto -
, porque consideram ingerência
estatal na programação das empresas e na decisão das famílias.
O que, segundo ela, cria “um conflito absurdo entre o
direito da criança e o direito de expressão.”
Paulo Henrique Amorim vê o debate sobre a mídia no
centro do debate político: “Não estamos discutindo a imprensa. Isso, como diz o
professor Roberto Schwarz, é uma ideia fora do lugar. Estamos discutindo a
Política.” Política que cada vez mais se desdobra no plenário do Supremo
Tribunal Federal.
Já que falava para estudantes de Direito, que vão
trabalhar no exercício da Lei e da Justiça, o ansioso blogueiro abriu a
apresentação lembrando da iniciativa de um Juiz de São Paulo de permitir a
transmissão ao vivo do julgamento do acusado de assassinar Mércia Nakashima:
“A culpa é da TV Justiça, que institucionalizou a
invasão da TV no processo judicial. O IBOPE participa da administração da Lei. O espectador é como
aquela massa enfurecida, que, nos filmes de faroeste, tira o suspeito da cela e o enforca em praça
publica.”
Assim como o Supremo na Ação Penal 470, esse Juiz vai
levar a TV e seus interesses empresariais e comerciais para o território em que
se celebra a Lei.
Paulo Henrique lembrou aos estudantes de Direito as
palavras do ministro Lewandowski, professor titular daquela casa: “como disse o
ministro Levandowski, o problema será quando o domínio do fato chegar a todos
os juízes do país. O problema será quando todos os julgamentos forem
televisionados”.
Paulo Henrique lança ainda um olhar ao ponto mais
nevrálgico do monopólio:
“A Globo tem 40% da audiência e 80% da verba destinada
à TV aberta, que, por sua vez é 50% de toda a receita publicitária do país. Se
você somar à Rede Globo a Globosat, a radio Globo e a CBN, o jornal Globo, o Valor etc etc, a Globo terá, sozinha, uma
empresa de capital fechado, sozinha ela terá MAIS DO QUE 60% DE TODA A
PUBLICIDADE DO PAIS.
“Em nenhuma democracia jovem do mundo, Bolívia,
Paraguai, Uruguai, Chile, Venezuela, Argentina, Portugal, Espanha… em nenhuma
há uma concentração como no Brasil”.
Paulo Henrique disse aos estudantes o que os leitores
do Conversa Afiada já sabem há muito tempo: a imprensa é o verdadeiro partido
de oposição no Brasil.
“O PiG (*) tem o poder! O PiG tem o poder de matar
Vargas, o PiG tem o poder de derrubar João Goulart, o PiG tem o poder de
impedir Brizola de ser Presidente, de tentar derrubar o Lula, de tentar
derrubar a Dilma [...] De julgar o mensalão. Dizer quem vota e a que horas
vota. Mas o PiG não tem o poder de ganhar eleição. O poder do PiG é o poder de
gerar crises, desestabilizar instituições: tirar o povo da jogada !”.
É o Partido da Imprensa Golpista, o PiG, expressão
cunhada pelo Deputado Fernando Ferro, ao se referir a um artigo de Ali Kamel,
diretor de jornalismo da Rede Globo.
Para o Professor Coelho, o quadro se mostra desolador.
A influência dos meios de comunicação se reflete diretamente na omissão crônica
do Congresso: “o que esperar de um Congresso onde muitos dos seus
representantes são donos de emissoras de rádio e TV, que fazem uso político das
outorgas que recebem.” Segundo ele, “a regulamentação no Brasil é uma ficção”.
O professor Serrano, nos debates, insistiu em que
quando se trata de regulamentação da mídia, na verdade, se trata de discutir a
soberania popular: até que ponto a República respeitará a soberania popular?
O Direito não é uma abstração, lembrou Serrano. Não
está fora do espaço vivido pelos cidadãos. E os agentes do Direito usam o
Direito com intenção – com intenção política.
E não se pode esquecer, disse Serrano, que a Constituição
americana foi feita para conter os avanços democráticos dos estados da jovem
republica americana.
Que a primeira Constituição francesa previa o voto
censitário, era uma Constituição burguesa.
E o que está em jogo, disse ele, é determinar até que
ponto a soberania popular será respeitada.
Para Renata Mielli, a regulamentação é um desafio que só pode ser superado pela
mobilização social: “a sociedade precisa se apropriar desse debate”, diz ela.
Renata conclui dando o tom do movimento pela regulamentação:
“Paulo Bernardo [ministro das Comunicações] passou três anos enrolando a
sociedade para admitir que o debate está fora da pauta do governo. Agora vamos
sem o Governo, sem os empresários. Vamos mobilizar um milhão e meio de
assinaturas, e vamos apresentar um projeto de iniciativa popular. Vamos
levantar esse debate na sociedade. Vamos à luta!”.
Paulo Henrique Amorim concorda com Renata.
É muito difícil a Presidenta Dilma e o Congresso
tomarem a iniciativa de enfrentar o PiG .
Ele lembrou que a discussão sobre a regulamentação na
mídia não é uma questão de Direito, uma questão de administração técnica de
meios eletrônicos ou impressos de comunicação.
No Brasil, a questão do PiG é A questão Politica.
O PiG é mais do que Imprensa.
O PiG é Poder.
E, hoje, no Brasil, como no Paraguai, quem dará o golpe
final no Golpe contra a Dilma será o Supremo.
“O PiG não ganha eleição, o PiG dá golpe. O ‘G’ de
Globo é o ‘G’ de Golpe”, disse o ansioso blogueiro.
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