Por Leonardo Sakamoto
A Ford do Brasil foi condenada pela Justiça do Trabalho
em um processo de R$ 400 milhões por terceirização ilícita e fraude tributária.
De acordo com o Ministério Público do Trabalho, responsável pela ação civil
pública, a empresa contratava empregados através da Avape, uma associação para
promoção de pessoas com deficiência, também ré no processo, que contava com
isenção fiscal. O problema é que dos 280 empregados que a instituição entregou
à Ford ao longo de mais de uma década de relacionamento, nenhum deles possuía
deficiência. À decisão, cabe recurso.
A sentença, proferida por Marcus Barberino, juiz do
Trabalho da 15a Região, e publicada no último dia 27, afirma que a Avape
funcionava como uma intermediária de mão de obra para que a Ford não arcasse
com direitos trabalhistas e contribuições previdenciárias em Tatuí. A montadora
possui uma pista de testes e um laboratório na cidade que são considerados
referências internacionais no aperfeiçoamento e projeto de veículos.
Ao longo do processo, a Avape justificou-se afirmando
que prestava atendimento a pessoas com deficiência em sua unidade de Tatuí
utilizando os recursos que obtinha da intermediação de mão de obra de pessoas
sem deficiência. Contudo, segundo com a sentença, poucos eram os atendidos.
De acordo com a ação civil pública, de responsabilidade
do procurador do Trabalho Bruno Ament, nem a associação, nem a Ford cumpririam
a legislação de inserção de pessoas com deficiência, que garante benefícios
fiscais. Isso poderia gerar um efeito dominó. Afinal, se outra montadora
descobrir que está sofrendo concorrência desleal através de dumping social,
isso pode levá-la a copiar a mesma metodologia, gerando repercussões negativas
à sociedade.
Em 2011, uma liminar solicitada pelo Ministério Público
do Trabalho e deferida pela Justiça proibiu a Avape de intermediar mão de obra
para a Ford em Tatuí e obrigando a montadora a contratar diretamente. No ano
seguinte, o Tribunal Regional do Trabalho confirmou a liminar e negou, por
unanimidade, um mandado de segurança para a montadora – que levou o caso ao
Tribunal Superior do Trabalho. Contudo, com esta decisão sobre a ação civil
pública, o mandado deixar de ter razão de existir. Após a liminar, a Avape
fechou a sua unidade de Tatuí.
Considerando que a organização social não possui
patrimônio para cumprir a sentença, a Ford terá que arcar com a quase
totalidade desses recursos: R$ 200 milhões para os Fundos Nacional e Estadual
de Direitos Difusos e R$ 200 milhões a serem investidos na cidade de Tatuí,
distante cerca de 130 quilômetros da capital paulista, em políticas de inserção
e formação de pessoas com deficiência, mas também voltadas aos outros cidadãos.
A empresa também foi condenada a contratar diretamente
todos os empregados listados na atividade-fim do seu campo de provas. A Justiça
não proibiu qualquer terceirização, mas apenas a ilegal, mantendo a
possibilidade de utilizarem prestadores de serviço para atividades secundárias
como limpeza e segurança. Por fim, a Ford também terá que veicular em cadeia
nacional de TV inserções que tratem da condenação, explicando que a situação
incitava a violação à dignidade humana, às regras de proteção do trabalho, à
livre concorrência e ao fair trade.
Questionada pela reportagem, a montadora informou,
através de sua assessoria de imprensa, que o processo ainda encontra-se sob
júdice. “Por este motivo, a Ford não se pronunciará neste momento, pois aguarda
uma solução final do processo por parte dos órgãos competentes.”
Em nota, a Avape informou que mantinha com a Ford de
Tatuí um contrato de terceirização para atividade-meio e não para atividade-fim
ou mesmo para contratação de pessoas com deficiência. Afirmou que a sentença de
primeira instância é “obscura e contraditória” e está entrando com embargos de
declaração na Justiça.
O processo corre com o número
0002153-24.2011.5.15.0116.
Com reportagem de Guilherme Zocchio.
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