Pular para o conteúdo principal

O triste papel de Eduardo Suplicy

Por Altamiro Borges
O senador Eduardo Suplicy (PT-SP) construiu a sua trajetória política na luta em defesa da democracia e dos direitos humanos. No ano passado, por exemplo, ele se destacou ao apoiar a luta dos moradores do Pinheirinho, expulsos pela tropa de choque de Geraldo Alckmin. Não dá para esconder seus méritos. Mas também não dá para amenizar seus defeitos, que são muitos e já lhe renderam alguns apelidos jocosos. Na semana passada, ele ganhou os holofotes da mídia por ser o cicerone da dissidente cubana Yoani Sánchez.
Com ou sem intenção, Eduardo Suplicy montou um palanque para a direita nativa atacar a revolução cubana – que ela sempre odiou - e a política externa dos governos Lula e Dilma. Na visita de Yoani Sánchez ao Congresso Nacional, o senador petista desfilou ao lado de tucanos, demos e até do fascista Jair Bolsonaro – todos “democratas” convictos! Na entrevista ao Estadão, ele ouviu as arrogantes críticas da cubana – similares às do governo dos EUA - à postura do Itamaraty de respeito à soberania dos povos.
Segundo o jornal, “a blogueira e ativista cubana Yoani Sánchez cobrou do governo Dilma Rousseff em São Paulo um ‘posicionamento mais enérgico’ e ‘duro’ ao abordar o tema de direitos humanos com o governo Raúl Castro. ‘Tem faltado dureza ou franqueza na hora de falar do tema de direitos humanos na ilha. Tem havido silêncios demais. Os povos não esquecem’, afirmou Sánchez, que participou de uma conversa com jornalistas e leitores do jornal O Estado de S.Paulo”. Suplicy acompanhou a dissidente na visita ao jornalão.
A direita midiática e partidária, que estava acuada
com as comemorações dos dez anos do PT no governo, explorou ao máximo a visita da cubana – que foi articulada pelo senador petista. Num gesto inusitado, Yoani Sánchez interrompeu uma sessão ordinária do parlamento brasileiro. Como se jacta o colunista João Domingos, no Estadão, “os partidos de oposição levaram ampla vantagem sobre o governo na obtenção de resultados políticos durante a passagem da blogueira cubana e colunista do Estado pelo Congresso”.
“PSDB, DEM e PPS mandaram ao Congresso militantes para abafar o ruído dos manifestantes pró-Cuba... A ida de Yoani ao Congresso foi proposta pelo deputado Otávio Leite e pelo senador Alvaro Dias, ambos tucanos. O DEM, por intermédio do deputado Mendonça Filho (PE), requereu proteção da Polícia Federal à blogueira, enquanto o PPS prestou a ela solidariedade”, relata o jornalista do Estadão. Eduardo Suplicy, apelidado de “Dom Quixote” pela blogueira, cumpriu o triste papel de apêndice da oposição de direita.
Ainda teve a cena constrangedora do encontro de Yoani Sánchez com Aécio Neves, o principal adversário da presidenta Dilma Rousseff nas eleições de 2014. Segundo relato do repórter Gerson Camarotti, da Rede Globo, ela teria feito um apelo ao senador mineiro: “Não nos deixe sós em Cuba. Muitas vezes nos sentidos abandonados lá”. Com a ajuda involuntária do petista, o cambaleante presidenciável tucano agora usa o episódio para atacar o governo e defender a “liberdade de expressão” – logo ele que censura a imprensa mineira.
Mas não foi só a direita partidária que explorou a visita da dissidente cubana. A mídia hegemônica também tirou a sua casquinha. Sem explicitar que Yoani Sánchez é “diretora” do antro golpista da Sociedade Interamericana de Prensa (SIP), que reúne os barões da mídia do continente, jornalões, revistonas e emissoras de rádio e tevê usaram a blogueira para criticar qualquer tipo de regulação dos meios de comunicação no Brasil. Atacaram Cuba para defender os seus privilégios. E Yoani Sánchez cumpriu a risca o seu papel.
Na mesma entrevista exclusiva ao Estadão, a correspondente da famiglia Mesquita – ninguém sabe se ela recebe algum salário e qual o seu valor – criticou a proposta do novo marco regulatório para o setor. “Quando se fala em regular a comunicação há que ter muito cuidado porque há uma linha tênue entre chamar a responsabilidade dos meios e a censura. É preciso ser muito cuidadoso e acredito que a regulação de meios deva ocorrer a nível de leis, da legalidade e não de governos, porque cada governo tem seus interesses”.
Em síntese, a visita da dissidente cubana serviu aos intentos da direita nativa. O circo midiático foi montado com esmero. Sobraram minutos de fama e muitos holofotes para Eduardo Suplicy. Até os “calunistas” que adoram ridicularizá-lo elogiaram o senador petista.  Esta exposição talvez o ajude nas suas pretensões eleitorais para 2014 – quando pretende disputar novamente o Senado. Mas o custo político foi elevado. O jornalista Raymundo Costa, do Valor, chegou a especular que ele pode perder a vaga no PT:
“O PT até aceitou a presença de Suplicy no lançamento da Rede, o partido de Marina Silva. Afinal, ela é uma ‘ex-companheira’, como se diz entre petistas. O que a cúpula considera inadmissível é o senador ficar de ‘abraços e beijos’ com uma dissidente do regime que, nos anos de chumbo no Brasil, ‘abrigou’ boa parte dos líderes que viriam constituir o PT. ‘Somos eternamente gratos’, diz um petista de alto coturno”. Pode ser mais uma intriga da mídia, mas é fato que a postura de Suplicy gerou constrangimentos no PT e no governo.
Suplicy pode até não perder a vaga na disputa ao Senado. Este decisão cabe ao PT. Mas o meu mísero voto ele já perdeu! Há anos faço panfletagens e voto no petista – algumas vezes até por falta de alternativas. Desta vez, porém, ele passou da conta!

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O mundo como fábula, como perversidade e como possibilidade: Introdução geral do livro "Por uma outra globalização" de Milton Santos

Por Milton Santos Vivemos num mundo confuso e confusamente percebido. Haveria nisto um paradoxo pedindo uma explicação? De um lado, é abusivamente mencionado o extraordinário progresso das ciências e das técnicas, das quais um dos frutos são os novos materiais artificiais que autorizam a precisão e a intencionalidade. De outro lado, há, também, referência obrigatória à aceleração contemporânea e todas as vertigens que cria, a começar pela própria velocidade. Todos esses, porém, são dados de um mun­do físico fabricado pelo homem, cuja utilização, aliás, permite que o mundo se torne esse mundo confuso e confusamente percebido. Explicações mecanicistas são, todavia, insuficientes. É a maneira como, sobre essa base material, se produz a história humana que é a verdadeira responsável pela criação da torre de babel em que vive a nossa era globalizada. Quando tudo permite imaginar que se tornou possível a criação de um mundo veraz, o que é imposto aos espíritos é um mundo de fabulações, q...

Brasil perde um dos seus mais importantes cientistas sociais

Por Ricardo Cavalcanti-Schiel Faleceu por volta das 21:30 do dia 26 de março de 213, vítima de um acidente de trânsito no Km 92 da Rodovia Bandeirantes, o diretor do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Unicamp, Prof. Dr. John Manuel Monteiro, quando regressava da universidade para sua residência em São Paulo. Historiador e antropólogo, John Monteiro foi um pioneiro na construção do campo temático da história indígena no Brasil, não apenas produzindo uma obra analítica densa e relevante, como também criando e estimulando a abertura de espaços institucionais e de interlocução acadêmica sobre o tema. Não seria exagerado dizer que foi em larga medida por conta do seu esforço dedicado que esse campo de estudos foi um dos que mais cresceu no âmbitos das ciências humanas no país desde a publicação do seu já clássico “Negros da Terra: Índios e Bandeirantes nas Origens de São Paulo” (1994) até o momento. Tendo tido toda sua formação acadêmica nos Estados Unidos (graduado pelo Col...

Preços de combustíveis: apenas uma pequena peça da destruição setorial

Por José Sérgio Gabrielli Será que o presidente Bolsonaro resolveu dar uma reviravolta na sua política privatista e voltada para o mercado, intervindo na direção da Petrobras, demitindo seu presidente, muito ligado ao Ministro Guedes e defensor de uma política de mercado para privatização acelerada e preços internacionais instantâneos na companhia? Ninguém sabe, mas que a demissão do Castello Branco não é uma coisa trivial, com certeza não é. A ação de Bolsonaro, na prática, questiona alguns princípios fundamentais da ideologia ultraneoliberal que vinha seguindo, como o respeito à governança das empresas com ações negociadas nas bolsas, a primazia do privado sobre o estatal e o abandono de intervenções governamentais em assuntos diretamente produtivos. Tirar o presidente da Petrobras, por discordar da política de preços, ameaça o programa de privatizações, pois afasta potenciais compradores de refinarias e tem um enorme efeito sobre o comportamento especulativo com as ações da Petrob...