Por Maurício Dias
da Carta Capital
O esforço do Supremo Tribunal Federal para impor à
Câmara dos Deputados a decisão final sobre a cassação dos parlamentares
condenados na Ação 470, o chamado “mensalão” petista, é a causa mais aguda e
temerária daquilo que os acadêmicos costumam chamar de “judicialização da
política”.
Se essa questão gerou uma crise institucional entre o
Judiciário e o Legislativo, contida e ainda não resolvida, ela promove também
um avanço da intromissão pessoal dos magistrados em causas menores em outras
instituições, em iniciativas controvertidas, para dizer o mínimo, como a que é
patrocinada agora por Luiz Fux.
O peso da toga de ministro do STF causou grande
constrangimento na Ordem dos Advogados do Brasil, seccional do Rio de Janeiro,
para onde ele telefonou e falou com os atuais e com os ex-dirigentes da
entidade. Pediu a inclusão do nome da filha dele, Marianna, uma jovem advogada de
31 anos, na lista a ser feita pela OAB para preencher vaga de desembargador, no
Tribunal de Justiça do Estado, pelo Quinto Constitucional da advocacia.
A vaga será aberta em julho. O ministro, no entanto,
trabalha desde já. Parece repetir, em nome da filha, o padrão usado em
benefício próprio quando buscou a vaga no STF: a conquista a qualquer preço.
O ritual oficial é comum. A OAB faz uma lista sêxtupla
que é encaminhada ao Tribunal de Justiça. Os desembargadores cortam três nomes
e enviam lista tríplice para o governador do estado. Ele faz a escolha.
É preciso lembrar que Sérgio Cabral jogou forte na
indicação de Fux ao STF. Por coincidência, dessas que os cristãos costumam
atribuir a desígnios divinos, Fux favoreceu o Rio de Janeiro em liminar que interferiu
na pauta da Câmara. A decisão do ministro suspendeu a votação sobre os vetos
feitos por Dilma à Lei dos Royalties. Eles seriam derrubados pelos deputados e
isso prejudicaria o Rio.
Iniciativas em causa própria, como faz Fux, geram
espanto e mancham a toga. E, mais grave, denunciam uma prática utilizada nos
tribunais corriqueiramente.
Tarefa semelhante à de Fux tem, também, Felix Fischer,
presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ele batalha para incluir o
filho, Octávio, na lista do Quinto da OAB do Paraná. Para isso, também
pressiona os dirigentes daquela seccional da OAB.
Do STF ao STJ. Do STJ de volta ao STF.
A filha do ministro Marco Aurélio Mello, do STF, foi
incluída, no fim de 2012, na lista do Quinto, nesse caso elaborada pelo Conselho
Federal da OAB. Ela busca a vaga de desembargadora do Tribunal Regional Federal
(TRF) da 2ª Região, no Rio de Janeiro. A escolha será da presidenta Dilma
Rousseff.
Gurgel para iniciantes
Em 1998, Carlos Eduardo Moreira Alves, filho do
ministro José Carlos Moreira Alves, hoje aposentado, tomou posse como Juiz do
Tribunal Regional Federal da 1ª Região, pelo atalho de sempre, o Quinto
Constitucional. Foi indicado em lista sêxtupla pelo Ministério Público Federal
e, em lista quádrupla, pelo TRF – 1ª Região.
Vista de certo ângulo, a árvore que retrata a Justiça
brasileira se assemelha a uma árvore genealógica. A inadequada intromissão dos
pais togados citados aqui, seguramente, mostra a falência do sistema de
escolha. E isso, neste momento em que o Judiciário perdeu o freio de contenção,
revigora a observação do filósofo inglês Francis Bacon (1561-1616), que, aqui,
é oferecido à meditação do Congresso Nacional: “Os juízes são leões, mas leões
sob o trono em que se assenta o Poder Político”.
Tocaia em Minas I
Os movimentos do procurador-geral da República, Roberto
Gurgel, são demoradamente calculados, como ocorreu agora com a ação contra
Lula. A base da decisão de Gurgel é a certeza de que a denúncia está preclusa.
Assim, a tentativa de envolver o ex-presidente no
“mensalão” não foi empurrada para Minas Gerais pelo fato de ser QG das
operações de Marcos Valério. Essa decisão passa por suposto conflito entre
Gurgel e José Adércio Leite, secretário-geral do Conselho Nacional do
Ministério Público (CNMP), oriundo de Minas Gerais, onde mantém residência e
ocupou a função de procurador-chefe da República.
Tocaia em Minas II
Adércio pediu remoção para Minas e Gurgel negou. Ele,
então, contestou a recusa no Supremo Tribunal Federal (STF). Inexplicavelmente,
porém, por causa do conflito, Gurgel manteve Adércio na função no CNMP.
Em Minas, onde Adércio opera politicamente, o
Ministério Público deve oferecer denúncia contra Lula, mas na Justiça Federal
será declarada a preclusão da ação. Caberá, no entanto, recurso ao Tribunal
Regional Federal, em Brasília.
Esse movimento contra Lula criará constrangimento ao
sucessor de Gurgel, em agosto, e talvez seja a última tentativa do
procurador-geral de influir na escolha do sucessor dele. O modo de Roberto
Gurgel operar lembra as tocaias no sertão mineiro.
Vale-tudo
Jeferson Coelho, Corregedor Nacional do Ministério
Público (CNMP), sugeriu a suspensão de Demóstenes Torres, por 60 dias, das
funções de procurador de Justiça de Goiás. Há quem aposte que a decisão não será
mantida.
A punição de Demóstenes não diz quando a suspensão
começa ou quando acaba. Além disso, a Lei Orgânica do Ministério Público de
Goiás não admite que procuradores vitalícios sejam suspensos preventivamente.
Apesar de tudo que fez e prometeu fazer, o ex-senador
ainda tem direitos.
Bola de cristal
Às vésperas da escolha do substituto do ministro Cezar
Peluso no STF, foi publicada uma lista com 12 nomes, da qual sairia a escolha
de Dilma. O nome de Teori Zavascki, o escolhido, não constava da relação.
Agora, o colunista corre risco mais
delicado e faz um rol de apenas dois nomes: José Roberto Barroso, advogado
constitucionalista que tem no arquivo carta de apoio de Raymundo Faoro dirigida
a Lula, quando presidia o País, e Eugênio Aragão, subprocurador-geral da
República que não frequenta reuniões do procurador-geral Roberto Gurgel.
Reencarnação do udenismo
Os tucanos reagiram ao discurso de Dilma, em cadeia de
rádio e tevê, contra o pessimismo exagerado da oposição à redução da tarifa de
energia. Sérgio Guerra, presidente do PSDB, acusou a presidenta de romper a
barreira democrática revivendo a divisa da UDN de que a eterna vigilância era o
preço da liberdade.
Esse alerta, refrão conservador dos anos 1950, levou o
Barão de Itararé a uma dedução: o sono era conquista recente. O selvagem, sem
meios de defesa, permanecia insone para se proteger das feras. E concluiu: “O
homem primitivo era udenista”.
Togados: A escolha
Além da indicação para uma vaga no STF, salvo
incidentes, a última que fará até 2014, a presidenta Dilma Rousseff começa o
terceiro ano de governo com três vagas para preencher no Superior Tribunal de
Justiça (STJ), a segunda instituição em importância política na hierarquia do
Judiciário brasileiro.
No momento, Dilma tem à disposição as vagas abertas no
STJ com as aposentadorias dos ministros Cesar Asfor Rocha, Massami Uyeda e, a
terceira, com a cadeira vazia do ministro Teori Zavascki, alçado ao STF. A
presidenta talvez seja forçada a descascar mais tarefas espinhosas desse tipo.
Especula-se sobre a aposentadoria antecipada de dois
ministros. Um deles é o enaltecido vice-presidente do STJ, Gilson Dipp,
internado há quatro meses em São Paulo, com problemas de saúde. O outro é o
ministro Ari Pargendler, que fala em renúncia.
Esse é o tema preferido dos cochichos nas salas,
antessalas e corredores do Judiciário. Neles variam os bons e os maus anseios.
Felizmente, até agora, não há registro de propostas de envenenamento do
cafezinho dos adversários.
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