Enviado por Luis
Nassif
“Em entrevista concedida à rádio ‘Voz da Rússia’, o
ministro da Defesa do Brasil, Celso Amorim, falou sobre a parceria entre
brasileiros e russos na área de Defesa. Recentemente, os dois países iniciaram
negociações para a aquisição de sistemas de defesa antiaérea russos, com
transferência de tecnologia.
Na conversa, Amorim aborda o tema e fala da
possibilidade de desenvolvimento conjunto de equipamentos mais modernos. “Essa
sugestão surgiu já na reunião do nosso chefe de Estado-Maior Conjunto com o seu
correspondente russo e com as empresas”, disse o ministro.
“Vou chamar a atenção para o fato de que ele foi lá com
várias empresas brasileiras. O que é muito interessante, porque isso já vai
preparando terreno para uma eventual produção no Brasil, um desenvolvimento
tecnológico conjunto”, completou.
Confira, abaixo, a íntegra da entrevista concedida a
“Voz da Rússia”.
VR: O senhor esteve
com a presidenta Dilma em dezembro na Rússia e foram realizados vários acordos
entre os dois países. Mas, como destacou a própria presidenta, a área
técnico-militar recebeu destaque especial. Como está indo essa cooperação
agora?
C.A: Bom, o acordo de cooperação militar assinado
abrange os mais diversos níveis. Por exemplo, havia dificuldade de treinamento
dos pilotos dos helicópteros russos que nós havíamos comprado. A empresa dava
treinamento básico, mas nós precisávamos de algo mais. E, com esse acordo, nós
teremos esse tipo de treinamento militar de maneira mais normal, mais fluida.
Além de muitas outras coisas.
A assinatura desse acordo, em si mesma, já é algo muito
importante, porque ela abre muitas outras avenidas de cooperação, de formação
para trabalhar em áreas avançadas que interessam à Rússia e ao Brasil. Seja na
cibernética, na área espacial ou de equipamento militar mesmo.
Houve essa aquisição dos helicópteros de combate, muito
bons, e, no início, houve um pouco de dúvida sobre a manutenção. Mas já
verifiquei que essas questões estão sendo encaminhadas e, naturalmente, no
espírito do próprio acordo de compra, esperamos que haja boa transferência de
habilidades e competências nessa área.
Nós sabemos que o
chefe do Estado-Maior, o general José Carlos De Nardi, esteve recentemente
também na Rússia negociando alguns acordos mais concretos.
C.A: É. A ida do general De Nardi foi resultado direto
das conversas entre os presidentes. O comunicado conjunto da visita, que
singulariza a área de defesa antiaérea, já previa a ida do chefe de
Estado-Maior brasileiro para tratar dessa possibilidade de cooperação.
Isso envolve, naturalmente, alguma aquisição, de acordo
com as nossas necessidades imediatas, mas também há a expectativa de que
empresas russas possam fabricar algum desses equipamentos aqui no Brasil.
Agora, as questões técnicas ainda estão sendo discutidas.
A visita foi muito proveitosa. Seguramente, terá
continuidade agora com a vinda do primeiro-ministro (Dmitri Medvedev), e a
nossa expectativa é a de que isso possa caminhar. Claro que tem muita coisa a
se discutir ainda, como aspectos financeiros, orçamentários, qual a
transferência de tecnologia, treinamento e todas essas coisas.
Mas uma eventual
produção no Brasil desses equipamentos modernos é de interesse brasileiro.
C.A: Sim. Não só dos equipamentos atuais, mas quem sabe
até de um equipamento que ainda está em desenvolvimento pela própria Rússia.
Isso antecipa um pouco
outra pergunta. A Rússia tem exemplos de desenvolvimento conjunto de aviões com
outros países. Isso poderia ser um caminho para o Brasil também?
C.A: Bom, nesse caso, nós não estamos falando de
aviões. Estamos falando desse equipamento de defesa antiaérea.
Independentemente da aquisição e da produção no Brasil de equipamentos já
existentes, há a possibilidade, também, do desenvolvimento conjunto de
equipamentos mais modernos. Isso está sendo discutido, mas essas coisas levam
algum tempo. Essa sugestão surgiu já na reunião do nosso chefe de Estado-Maior
Conjunto com o seu correspondente russo e com as empresas. Vou chamar a atenção
para o fato de que ele foi lá com várias empresas brasileiras. O que é muito
interessante porque isso já vai preparando terreno para eventual produção no
Brasil, um desenvolvimento tecnológico conjunto.
A Rússia nos informa que
existe uma lei que protege a propriedade intelectual justamente na área de
defesa entre a Rússia e o Brasil. Esse acordo, na verdade, já foi ratificado
pelo parlamento russo e, segundo eles, só falta agora o Brasil ratificar
também.
C.A: Há um pequeno problema interno, mas isso vai ser
superado. Nós tivemos muito recentemente uma lei de acesso à informação, que
não tem nada a ver com a parte tecnológica. Então, é preciso estudar todos
esses acordos – não só com a Rússia – que envolvem cláusulas de confidencialidade
para que possam ficar dentro da lei brasileira. Mas eu não vejo nenhuma
dificuldade nisso. É um problema puramente burocrático de atualização.
Quando nós começamos a
recolher as perguntas da redação russa, percebemos que lá as pessoas ainda têm
pouco conhecimento dos desafios do Brasil na área da defesa. No imaginário
russo, o Brasil é um gigante, muito forte, que não tem nenhuma preocupação com
a defesa. Eu queria que o senhor falasse um pouco como o Brasil se vê hoje
nessa questão.
C.A: Que é um gigante muito forte, isso é verdade. E
que no futebol a gente nunca se preocupou muito com a defesa – por fazer sempre
muitos gols, desde a época do Garrincha –, isso também é verdade. Mas, deixando
a brincadeira de lado, obviamente o Brasil não pode ser uma das maiores
economias do mundo, ser um dos maiores repositórios de água doce,
biodiversidade, de capacidade de produção de alimento, ter a Amazônia do
tamanho que é e não se preocupar com a defesa. Não é possível isso.
Embora tenhamos dez vizinhos, nós não temos problemas
com nenhum deles. Todos os problemas de fronteira que nós tínhamos foram
resolvidos diplomaticamente há mais de cem anos. A relação nossa com todos
esses países é uma relação de amizade e cooperação. Mas isso não quer dizer, também,
que nós não temos que defender nossas fronteiras de outras situações: grupos
irregulares, traficantes de drogas etc.
Pelas razões que eu enunciei antes, tendo toda essa
riqueza natural, esse parque industrial e essa capacidade de produção que a
gente tem, quem garante que, no futuro, um conflito até entre terceiros não
poderá ter repercussão aqui? Esperamos que não, mas a melhor maneira de evitar
isso é ter a nossa defesa. Por isso que eu digo: do ponto de vista regional, na
América do Sul, cooperação; do ponto de vista global, dissuasão. Sem perder de
vista que também tem que ter cooperação, nada é preto e branco.
Essa é a maior
preocupação então? É para dissuasão no caso desses eventos de maior
envergadura.
C.A: É para o caso de algum país querer se aventurar
onde não deve.
Essa preocupação é
muito semelhante ao caso da Rússia...
C.A: Eu acho que o Brasil e a Rússia têm muitas coisas
em comum. Os dois são do BRICS, são países ricos em energia, com população
semelhante, extensão territorial. Claro que há duas grandes diferenças: a
Rússia tem bomba atômica e nós não temos e a Rússia é membro do Conselho de
Segurança da ONU e nós não somos. Eu espero que, em breve, só haja a primeira
diferença, porque bomba atômica nós não queremos ter.
E quanto ao projeto do
submarino?
C.A: É um submarino de "propulsão nuclear". É
sempre bom deixar claro. O que é nuclear no submarino não são as armas que ele
leva. O que é nuclear é a propulsão. Ele usará energia nuclear como poderia
estar usando diesel ou biocombustível.
É um projeto que está caminhando, está avançando. Os
primeiros desenhos, as primeiras capacidades já foram mais ou menos adquiridas,
na França. O pacote envolve um submarino nuclear mais quatro submarinos
convencionais e nós estamos recebendo a primeira parte dos convencionais. Mas
quanto ao desenho e ao projeto do submarino nuclear, nós já estamos bastante
avançados. Agora, o que diz respeito à geração de energia é totalmente nosso. A
França não tem nada a ver com isso, com a parte do propulsor. É 100% nacional.
Sobre a licitação do
avião, não sei se posso perguntar se tem alguma novidade, alguma previsão...
C.A: Perguntar não ofende, mas não tenho nenhuma
novidade para dizer no momento. No futuro, outros projetos sempre estarão em
aberto.
Se a Rússia tiver
alguma chance de entrar, com seus equipamentos, é só num outro projeto... se
aparecer?
C.A: Já entrou com os helicópteros.
Sei. Aliás, tem um
projeto de outro helicóptero, pela Odebrecht, se não me engano.
C.A: Bom, aí eu não sei se era militar ou civil. Isso não
foi conversado em detalhe. O que eu posso lhe dizer sobre o que foi conversado
em profundidade na visita da presidenta e gerou muito rapidamente uma missão...
Em três semanas mais ou menos, nós mandamos o nosso Estado-Maior Conjunto para
os rigores do frio russo... Me contaram que ele pegou vinte graus negativos.
Com relação a essa
visita e à visita agora do primeiro-ministro Dmitri Medvedev, existe alguma
expectativa de assinatura, de fechamento desses acordos?
C.A: Eu acho que a questão da defesa antiaérea começou
agora. Acho que haverá um relato, é possível que se mencione algum aspecto,
algum detalhe que não tenha ficado claro. Não sei se há intenção de se fazer
algum outro memorando. O acordo nós acabamos de assinar. Então, da nossa parte,
não há necessariamente o desejo. Mas também não excluo a possibilidade de que,
se houver uma proposta, ela será examinada.
FONTE: publicado no site da rádio “Voz da Rússia” e transcrito
no portal “Vermelho” (http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_noticia=205536&id_secao=1).
[Imagem do Google adicionada por este blog ‘democracia&política’].
Comentários
Postar um comentário