Por Marco Antonio L., do IHU Unisinos
"Muita gente pequena em muitos lugares pequenos,
fazendo coisas pequenas mudarão a face da Terra". Entrevista com Lourdes
Dill
"Nós, hoje, no Projeto Esperança/Cooesperança,
atuamos em 34 municípios. No território da cidadania são mais de 5 mil famílias
beneficiadas, em um universo de mais de 23 mil pessoas e 260 grupos organizados
trabalhando em forma de feira", afirma a nova integrante do Conselho de
Desenvolvimento Econômico e Social do Rio Grande do Sul.
Desde o dia 22 de janeiro, a religiosa e coordenadora
do projeto Esperança/Cooesperança de Santa Maria, Irmã Lourdes Dill integra o
Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social do Rio Grande do Sul, conhecido
como “Conselhão”. O grupo é formado por 90 representantes da sociedade civil
que dialogam com o governo do Estado sobre os mais variados temas. São
escolhidos conselheiros, conforme os critérios estabelecidos pelo Palácio
Piratini, pessoas de ilibada conduta e reconhecida representatividade regional
ou estadual. A escolha dos nomes é feita pelo próprio governador, Tarso Genro.
Em entrevista por telefone à IHU On-Line, Irmã Lourdes
falou sobre o convite do governo do Estado e das ações que realiza em Santa
Maria e região, local onde mora e desenvolve seu trabalho social. “Para mim foi
uma alegria muito grande”, avalia. “O Conselho de Desenvolvimento Econômico e
Social do Rio Grande do Sul é uma espécie de uma assessoria de reflexão junto
ao governador do Estado. Então, o convite veio diretamente do gabinete do Tarso
Genro. Ele convidou porque conhece a nossa trajetória de trabalho em Santa
Maria, na área social, na área da economia solidária e cooperativismo”,
complementa.
Confira a entrevista.
IHU On Line - Como a senhora recebeu o convite para
participar do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social do Rio Grande do
Sul?
Irmã Lourdes
Dill - Para mim foi
uma alegria muito grande, porque este Conselho foi criado já desde o início do
governo Tarso, e ficarei no grupo durante dois anos, são 90 pessoas. O Conselho
de Desenvolvimento Econômico e Social do Rio Grande do Sul é uma espécie de uma
assessoria de reflexão junto ao governador do Estado. Então, o convite veio
diretamente do gabinete do Tarso Genro. Ele convidou porque conhece a nossa
trajetória de trabalho em Santa Maria, na área social, na área da economia
solidária ecooperativismo. Daí ele me convidou agora nesse segundo momento,
2013 e 2014, para contribuir também com essas 89 pessoas de diferentes áreas de
todo o Rio Grande do Sul, para ajudar nessa reflexão. Então, eu recebi com alegria,
sabendo também da importância que tem o nosso trabalho, o trabalho das
organizações e das entidades que podem somar e somar muito junto com as
políticas públicas. Então para mim foi uma alegria, dei meu sim. Com certeza eu
tenho também uma contribuição a dar. E também o benefício que isso poderá
trazer para as organizações, para as iniciativas também da economia solidária,
da agricultura familiar, do comércio justo, do cooperativismo, dessas áreas
todas que estarão também refletindo nesse “Conselhão”, que é chamado.
IHU On Line - A senhora acompanha o trabalho
desenvolvido pelo Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social do Rio Grande
do Sul, no sentido de debater e propor diretrizes para promover o
desenvolvimento econômico e social no Estado? Qual sua expectativa ao
participar do “Conselhão”?
Irmã Lourdes
Dill - Eu tenho
certeza que o “Conselhão” vai contribuir, porque o governador, na sua
instância, fez um pedido de reflexão e assessoria, ao escolher 90 pessoas de
todo o Estado do Rio Grande do Sul. Então com certeza vai levar em conta esta
reflexão, os estudos e também as sugestões que esse grupo dará para que se
melhore, se qualifique em todo o Estado também a dimensão das políticas
públicas, o trabalho como um todo. Porque o governo, ele está a serviço de uma
população, né. O Rio Grande do Sul é um Estado muito grande e tem um papel
muito grande. Tenho uma expectativa muito grande que essas sugestões todas,
essa reflexão, sejam levadas em conta.
IHU On Line - A Economia Solidária ainda tem espaço nas
discussões do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social do Rio Grande do
Sul? Desde quando e por que a senhora se engajou nesse projeto de Economia
Solidária?
Irmã Lourdes
Dill - No Projeto
Esperança/Cooesperança da arquidiocese aqui de Santa Maria eu trabalho há quase
26 anos. Eu estou desde o início, junto com o Dom Ivo Lorscheiter, que foi um
grande admirador, conosco do trabalho da Unisinos e estudou também com os
Jesuítas. O Dom Ivo foi um grande apaixonado pelo cooperativismo e pela economia
solidária. E eu estou desde o início da prática, em 1987. Faz 26 anos agora em
março. O Dom Ivo tinha já um grupo de professores de várias universidades, a Unisinos
também sempre contribuiu muito conosco da reflexão e foi, então, nos anos 80
que começou essa ideia em Santa Maria, junto com a Caritas Rio Grande do Sul,
de criar uma experiência diferente, que começou com os projetos alternativos
comunitários, cooperativismo, e depois foi se tornando essa economia solidária,
que hoje está presente no Brasil e praticamente em todos os continentes do
mundo e na América Latina está muito forte. E hoje também encaminhando para uma
política pública, em nível federal, em nível estadual e também em nível local,
pois muitos municípios, já têm Conselhos. E tem o Projeto Esperança/Cooesperança,
nós participamos nos três níveis de Conselho. Nós temos o Conselho municipal de
Santa Maria, economia solidária tem o Conselho estadual e o Conselho nacional.
E nós acreditamos que este é o caminho do futuro, especialmente para diminuir a
pobreza, a miséria e também toda a dimensão do desemprego, que hoje nós sabemos
que não tem emprego para todos e não vai ter para todos. Agora, tem trabalho,
trabalho de organização, trabalho de produção, também formas alternativas do
comércio justo e essas dimensões todas que são também trabalhadas nas feiras,
nas lojas de economia solidária, a gente sabe que esse jeito, esse novo modelo
de economia solidaria sustentável está crescendo em todo o Brasil e nos outros
continentes também.
IHU On Line - Como a senhora avalia o Projeto
Esperança/Cooesperança, que funciona desde 1987? Quais os principais resultados
do projeto e seus limites diante da conjuntura atual?
Irmã Lourdes
Dill - Eu poderia
dizer assim, com muita alegria, já que estou na prática desde o início, nós
celebramos em 2012 o jubileu, o primeiro jubileu do Projeto
Esperança/Cooesperança, os 25 anos. Que foi um ano muito rico também de
reconhecimento. Temos uma revista e os resultados são inúmeros, especialmente
na organização, na produção ecológica, na consciência de um consumo mais justo,
mas ético, mais solidário e também essa dimensão que o consumidor hoje já
diferencia os produtos produzidos pela economia solidária e agricultura
familiar em um mercado tradicional. Então nós, hoje, somos respeitados, nós
somos buscados, nós viajamos para muitos lugares levando também essa
experiência como algo que deu certo. E claro, não está perfeito, porque sempre
uma experiência dessas vai estar a caminho, ela nunca vai estar pronta. E os
grandes desafios, eu diria assim, é multiplicar este trabalho e multiplicar com
muita força e muita coragem e fazer com que as políticas públicas apoiem cada
vez mais experiências desse porte.
Nós, hoje, no Projeto Esperança/Cooesperança, atuamos
em 34 municípios. No território da cidadania são mais de 5 mil famílias
beneficiadas, em um universo de mais de 23 mil pessoas e 260 grupos organizados
trabalhando, então, em forma de feira. Tem as lojinhas, os pontos fixos de
comercialização, e temos todos os sábados um grande Feirão Colonial, há 20
anos. Então o Projeto Esperança/Cooesperança tem 25 anos, o Feirão Colonial
passa dos 20 anos e em 2013 também vamos completar os 20 anos da Feira de
Economia Solidária do Mercosul, que a Unisinos também, com muita alegria,
sempre participa. São eventos que se realizam no mês de julho e esse ano essa
feira, possivelmente a mais antiga da América Latina, de articulação em nível
mundial. E na última feira nós tivemos a presença de 170 mil pessoas que
passaram por ela durante os três dias, com inúmeros seminários, oficinas,
atividades culturais e, assim, com uma grande articulação que as pessoas ficam
entusiasmadas e querem também iniciar experiências desse tipo em suas cidades,
seus municípios, estados e países.
IHU On Line- Como a Igreja se posiciona diante da
proposta da Economia Solidária?
Irmã Lourdes
Dill - Sim, porque,
na realidade, o Projeto Esperança/Cooesperança é um braço social da arquidiocese
de Santa Maria, que de 12 anos para cá é da arquidiocese. Então nós temos, sim,
a partir do Dom Ivo, que já faleceu, a partir do Dom Hélio, que é o nosso
arcebispo, sim, apoio da nossa arquidiocese, que valoriza e cada vez mais busca
o fortalecimento desse trabalho. Para a Igreja, como um todo, a CNBB tem o seu
braço na área social, pastorais sociais e tenho dito, a Igreja nunca deve temer
em apoiar experiências desse porte. Nós sempre como Igreja podemos e devemos
apoiar ainda mais. É um trabalho que deu certo, a Igreja pode também mostrar
experiências para os governos que deram certo e é o nosso caso. Essa
experiência não é uma experiência de prefeitura, nem de Estado, nem de governo.
Nós buscamos apoio dos governos, mas é uma experiência da Igreja, no caso, da
arquidiocese de Santa Maria. E temos tido, sim, muito apoio das pastorais,
movimentos e buscamos, então, o apoio também das políticas públicas, dos
governos e das organizações. E temos um apoio significativo das universidades,
que hoje nós temos infinitos trabalhos acadêmicos, e isso também queria
ressaltar muito, muitos trabalhos de final de curso, trabalhos de mestrado, de
especialização e vários trabalhos de doutorado a partir da nossa experiência,
que é motivo de estudo hoje.
Esse trabalho nos alegra muito e também mostra para as
universidades o quanto é importante poder qualificar também os profissionais
para no futuro trabalharem cada vez mais nessa área. São áreas bem
diferenciadas e que nesses estudos têm inúmeros livros já escritos e também
escrevemos vários livros já a partir da nossa experiência. Então isso nos
alegra muito.
2º Fórum Mundial de
Economia Solidária
E por último, se eu puder dar uma palavra sobre o 2º Fórum Mundial de
Economia Solidária, que vai ser realizado em Santa Maria de 11 a 14 de julho de
2013, agora, são quatro dias e esse Fórum aconteceu pela primeira
vez em 2010, quando celebramos no Rio Grande do Sul os 10 anos do Fórum Social
Mundial. Ele nasceu por causa da feira cancelada por conta da gripe suína, que
naquele ano a Justiça de Santa Maria cancelou por um pouco de medo dessa gripe.
E então esse Fórum será a segunda edição e possivelmente a terceira edição deve
ocorrer em 2015 no Paraguai.
Esse Fórum não vai ser sempre em Santa Maria, ele vai
acontecer mais uma vez em Santa Maria e depois ele vai ir pelos países, pelos
continentes. Essa é a meta desse grupo que se criou em torno de 15 Estados do
Brasil que estiveram presentes nessa decisão. Já fizemos um encontro
preparatório e a gente já convida a todos que são parceiros da Unisinos nessa
temática, para estar se organizando e colocar na agenda de 11 a 14 de julho a
2º Fórum Mundial de Economia Solidária. O evento será junto com os 20 anos da
Feira de Santa Maria, pois é assim que nós falamos dessa temática.
Deixo um provérbio africano: “Muita gente pequena em
muitos lugares pequenos, fazendo coisas pequenas mudarão a face da Terra.”
Nós temos certeza que essas experiências articuladas e
trabalhadas em rede vão ser o futuro desse modelo de desenvolvimento solidário
sustentável e territorial que vai ajudar a qualificar o planeta Terra,
melhorando a qualidade de vida de muitas pessoas, no setor econômico, social,
político, eclesial e também em toda essa dimensão ambiental que hoje nenhum
projeto do mundo pode deixar de fora. Então, temos certeza que este é o caminho
e um caminho muito próspero que vai fortalecendo essas iniciativas. Eu agradeço
muito todos àqueles que são nossos parceiros e nesse momento agradeço muito
especialmente a Unisinos.
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