Um bom artigo que ajuda a entender a renúncia do Papa, além dos comentários superficiais dos analistas de plantão.
ANTÓNIO MARUJO
No Vaticano, em
Novembro de 2010 AFP
ALBERTO PIZZOLI
Papa não controla a Cúria, cartas falam de corrupção e
Bento XVI preocupa-se com eventuais cismas. No Vaticano, os últimos meses
adensaram o ambiente de fim de pontificado. (Texto publicado na edição de 15 de
Abril de 2012)
A Cúria Romana tornou-se um monstro ingovernável que o
próprio Papa, de perfil sobretudo intelectual e acadêmico, já não consegue
controlar.
No Vaticano, nas vésperas do sétimo aniversário da
eleição de Bento XVI, parece viver-se já um ambiente de final de pontificado,
semelhante ao que caracterizou a última década de João Paulo II.
O diagnóstico é feito por responsáveis do Vaticano
ouvidos pelo PÚBLICO e resulta de diferentes episódios dos últimos meses, onde
não faltaram acusações de lutas pelo poder e a divulgação de cartas dirigidas
ao Papa a denunciar corrupção. Também há quem relativize, dizendo que os casos
apenas traduzem luzes e sombras de uma instituição plural, onde convive o
melhor e o pior da natureza humana. O PÚBLICO escolheu nove casos recentes que
traduzem este ambiente e falou com vários observadores no Vaticano.
A estrutura central do catolicismo parece colada com
cuspo. Bento XVI, que em Fevereiro se tornou o sexto Papa mais velho dos
últimos 700 anos, já não tem mão na Cúria. Ao mesmo tempo, tenta evitar a custo
um cisma dos católicos germânicos.
E parece ter desistido de conseguir uma unidade apenas
aparente com os tradicionalistas, que há 50 anos recusam o Concílio Vaticano II
e o diálogo ecumênico e inter-religioso.
O alemão Joseph Ratzinger, eleito Papa a 19 de Abril de
2005, completa amanhã 85 anos de idade. Quinta-feira, assinala o sétimo
aniversário da sua eleição. Mas parece que o Papa tem poucas razões para
celebrar, tendo em conta os problemas dos últimos meses.
A viagem de Bento XVI ao México e a Cuba, há três
semanas, foi um bálsamo a refrescar das más notícias de Fevereiro. “O
acolhimento foi espetacular porque os latino-americanos têm uma grande
religiosidade”.
“Mas isso aconteceu por ser o Papa e não por ser Bento
XVI em particular”, diz um responsável do Vaticano, profundo conhecedor do
catolicismo da América Latina.
O cisma
Quinta-Feira Santa, dia em que os cristãos celebram a
instituição da eucaristia na Última Ceia de Jesus, o Papa resolveu advertir
contra um "apelo à desobediência" que ameaça cavar um cisma no
catolicismo austríaco.
A Pfarrer-Initiative (Iniciativa dos Párocos) foi até
agora subscrita por 400 dos cerca de dois mil padres do país (disponível, em
português, em www.pfarrer-initiative.at/).
No texto, os padres afirmam sete pontos. Entre eles,
garantem que irão rezar em todas as missas pela reforma da Igreja, que não
recusarão a comunhão aos divorciados em segunda união e a cristãos de outras
Igrejas e que não celebrarão mais que uma missa aos domingos para evitar
"digressões litúrgicas". Afirmam ainda que recusam a proibição de os
leigos falarem nas igrejas, dizem que cada paróquia deve ter um responsável,
que pode ou não ser padre. E são a favor da ordenação de mulheres.
Esta não é a primeira manifestação crítica oriunda do
mundo germânico.
Há um ano, centena e meia de teólogos de língua alemã
(dos 400 que existem) defendiam a reforma da Igreja e o fim do celibato
obrigatório medida que o próprio Ratzinger advogara há décadas.
Já em 1989, a Declaração de Colônia juntara 200
teólogos na defesa da liberdade de investigação teológica.
Há 17 anos, na Áustria, surgia a Petição do Povo de
Deus, depois alargada a vários países e assinada por milhões de católicos, onde
se pediam também reformas na Igreja. Foi essa petição que deu origem a grupos
como o Nós Somos Igreja.
Agora, o Papa sentiu que a ameaça pode ser séria. Na
homilia, Bento XVI afirmou que "um grupo de sacerdotes publicou um apelo à
desobediência, referindo ao mesmo tempo também exemplos concretos de como
exprimir esta desobediência, que deveria ignorar até mesmo decisões definitivas
do magistério, como, por exemplo, na questão relativa à ordenação das
mulheres".
Ratzinger afirmava querer "dar crédito aos autores
deste apelo, quando dizem que é a solicitude pela Igreja que os move, quando
afirmam estar convencidos de que se deve enfrentar a lentidão das instituições
com meios drásticos para abrir novos caminhos e colocar a Igreja à altura dos
tempos de hoje". Mas perguntava: "Será um caminho a
desobediência?" O movimento Nós Somos Igreja (NSI), que apoia os padres
austríacos, reagiu, criticando que nunca o Vaticano ou os bispos tinham estado
disponíveis para ouvir os católicos críticos: "Bento XVI, tal como o Papa
Wojtyla, não quer definitivamente refletir" sobre questões como o celibato
ou a ordenação de mulheres e homens casados. E acrescentava que o arcebispo de
Viena, cardeal Cristoph Schönborn, "parece ter tentado, mas não conseguiu
levar o debate até Roma".
Talvez para compor a questão, no próprio Domingo de
Páscoa o Papa destacou a importância das mulheres na vida de Jesus, já que foi
mulheres quem primeiro anunciou a ressurreição. E afirmou: "Naquele tempo,
em Israel, o testemunho das mulheres não podia ter valor oficial, jurídico, mas
elas viveram uma experiência de ligação especial com o Senhor [e destacam-se]
nas narrativas das aparições de Jesus ressuscitado, como de resto acontece nas
da sua paixão e morte." As referências de Ratzinger parecem mostrar uma
preocupação por aquilo que se passa na Áustria, diz um observador das questões
católicas europeias. Schönborn, de acordo com o jornal católico Avvenire, terá
convidado recentemente um católico homossexual e o seu companheiro para o
debate. O convidado tinha sido eleito para um cargo importante.
Schönborn defendeu que era importante refletir algumas
questões e agir evangelicamente. Mas não conseguiu levar a sua voz ao Vaticano.
A fratura
Amanhã mesmo termina o prazo dado pelo Vaticano para
uma resposta da Fraternidade Sacerdotal S. Pio X (FSSPX) a várias exigências da
Santa Sé. O silêncio dos últimos dias parece indicar que os integristas estão
muito divididos e podem não aceitar o que há muito contestam e está na origem
da sua dissidência: a doutrina do Concílio Vaticano II, nomeadamente na ideia
da liberdade religiosa e no diálogo ecumênico e inter-religioso.
O caso começou quando Bento XVI decidiu tentar uma
aproximação aos integristas, dando-lhes a possibilidade de regressar à Igreja,
mediante a criação de um estatuto especial. Como gesto de boa vontade, o Papa
retirou a excomunhão sobre os quatros bispos sucessores de Marcel Lefebvre um
dos quais, veio a saber-se, negava o Holocausto, o que motivou uma carta do
Papa aos bispos do mundo inteiro a pedir desculpa pela falha de informação.
Em França, onde os lefebvrianos são numerosos, muitos
responsáveis católicos ficaram preocupados.
Após reuniões e trocas de cartas, o Vaticano entregou
ao superior da FSSPX um memorando com os princípios doutrinais para a aceitação
dos dissidentes na Igreja. A resposta inicial da fraternidade foi considerada
insuficiente "para ultrapassar os problemas doutrinais na base da fratura".
Por isso o Vaticano pediu nova resposta.
O silêncio dos últimos dias apenas foi quebrado por um
lamento do superior da FSSPX , o bispo Bernard Fellay: "Ganhamos
justamente hábitos de independência e não damos conta. Queremos fazer como
queremos." Dizia o La Croix quinta-feira que a convicção, em Roma e em
Êcone (sede da FSSPX, na Suíça), é que, se não houver acordo desta vez, ele não
existirá nunca. Mas, acrescentava o jornal, se houver acordo, ele suscitará
muitas incompreensões no catolicismo francês.
O cardeal
No centro de várias das polemicas recentes parece estar
o cardeal Tarcisio Bertone, secretário de Estado do Vaticano e número dois da
estrutura, um dos poucos que merecem a confiança pessoal do Papa. Depois de ter
trabalhado com Ratzinger na Congregação para a Doutrina da Fé, a nomeação de
Bertone para a Secretaria de Estado foi bem vista no início, por ser alguém
oriundo de fora da diplomacia da Santa Sé.
Cedo a escolha se revelou fonte de problemas. Em casos
como o discurso em que o Papa falou de Maomé ou na aproximação aos integristas,
Bertone não soube prevenir os episódios, nem gerir as crises consequentes.
Agora, é acusado por vários dos seus pares de
incapacidade de gestão, de viajar demasiado e de não saber tratar sequer com
polidez os seus interlocutores. Ninguém põe em causa a sua honestidade, mas o
modo de governar.
Corre mesmo à boca cheia no Vaticano que, no ano
passado, por causa de uma questão relativa a um hospital católico de Milão, o
então arcebispo da diocese, cardeal Dionigi Tettamanzi, terá dito ao Papa:
"Santidade, peça ao seu secretário de Estado para pelo menos ser bem educado
com as pessoas." Bertone é ainda alvo de outra crítica: cada vez que havia
nomeações de novos bispos ou responsáveis da Cúria, o jogo era o de adivinhar
quantos não eram salesianos Bertone pertence a esta ordem religiosa. Mas a
acusação pode não ser muita justa: em 2006, quando foi nomeado secretário de
Estado, havia 107 bispos salesianos. Em Outubro de 2011, o número era de 122.
"O Papa só confia nele, mas já há vários cardeais
a colocar a questão da sua continuidade", diz outro observador bem
colocado. Em Janeiro, as reportagens do Gli Intoccabili, da televisão La Sette,
onde foram divulgadas cartas comprometedoras dirigidas ao Papa e a Bertone,
apresentavam cardeais de rosto escondido a criticar o secretário de Estado.
Numa entrevista, há três semanas, ao La Stampa, Bertone
defendia-se com a "fidelidade ao Papa", que é a sua "estrela
polar", dizendo que só depende de Bento XVI a sua continuação ou não no
lugar. "Pessoalmente, não consigo explicar esta agressividade, uma vez que
não mudei o meu caráter, no espírito de fraternidade que me caracteriza como
salesiano, apesar dos meus defeitos", dizia, citado pela AFP. E sobre
Viganò afirmava que "em nenhum organismo é possível garantir a honestidade
de todos os funcionários".
A glória
Em causa ainda o modelo de comunicação entre os
organismos da Cúria.
A 28 de Janeiro, o Papa reuniu todos os responsáveis
dos dicastérios, mas alguns deles, como relatava o La Croix nessa altura,
pensam que a frequência destas reuniões é demasiado rara. Com Bento XVI, isso
acontecera, antes, em Novembro de 2010 e Junho de 2011. No encontro, Bertone
pediu mais competência, colaboração mútua, confiança recíproca e reserva na
informação.
O próprio Papa tentou alertar para vários perigos, em
dois discursos, em Fevereiro. Falando aos seminaristas de Roma, avisou: "O
poder da finança e dos meios de comunicação, ambos necessários e úteis, por
vezes correm o risco de dominar o homem. (...) O mundo das finanças já não
representa um instrumento para favorecer a vida do homem, mas torna-se um poder
que o oprime." No discurso do consistório em que formalizou a nomeação de
22 novos cardeais, Ratzinger avisaria contra os "sonhos de glória"
nos cargos de responsabilidade da Igreja.
A sucessão
O consistório pode ter marcado também um episódio mais
na luta pelo poder. Ao nomear 22 novos cardeais, o Papa acentuou a componente
europeia (67) e italiana (30) num futuro conclave. A América Latina, onde está
quase metade dos católicos do mundo inteiro, tem apenas 22 cardeais, um quinto
dos eleitores de um novo Papa.
Acentuou-se também o peso da Cúria Romana no Colégio
Cardinalício.
Praticamente todos os responsáveis de organismos da
Cúria foram designados cardeais. O jornal La Croix notava que a maior parte dos
chefes dos dicastérios nomeados cardeais são próximos de Bertone.
A sucessão de Bento XVI não aparece ainda com muita
premência, mas faz todo o sentido que comece a ser colocada. Na recente viagem
ao México e a Cuba, o Vaticano divulgou fotos do Papa usando uma bengala.
Sabe-se em Roma que a constituição física de Ratzinger
é frágil e que o Papa tem, desde há anos, uma situação cardíaca delicada.
Bento XVI pode ainda durar vários anos. Mas, pergunta
um dos observadores ouvidos pelo PÚBLICO, pode um homem nestas condições e com
esta idade levar avante o governo de uma instituição que congrega mais de mil
milhões de pessoas? Mais ainda, sabendo-se que ele "não é um homem de
governo".
Comentam-se alegadas pressões para que o próximo Papa
seja um italiano. Ou que um homem interessado em fazer pontes como o cardeal
Schönborn seja afastado da corrida.
O próximo conclave, que pode ainda estar distante, tem
todos os ingredientes para não ser fácil.
As cartas
No início deste ano, a divulgação de várias cartas
dirigidas ao Papa e ao secretário de Estado fez estalar a polêmica. Autor dos
documentos: o arcebispo Carlo Maria Viganò, que foi número dois do Governatorato
do Estado do Vaticano (espécie de Ministério da Administração Interna) entre
Julho de 2009 e Outubro de 2011. Atualmente, Viganò é o núncio (embaixador) da
Santa Sé nos Estados Unidos. A mudança em tão pouco tempo não será alheia ao
que ele denunciava: corrupção, favores e clientelas no interior do Vaticano.
"Quando aceitei [o lugar], nunca pensei
encontrar-me perante uma situação tão desastrosa", escrevia ele, em Abril
de 2011, numa carta ao Papa.
Nas missivas, o arcebispo citava exemplos de má gestão
e dava a entender que Bertone teria pelo menos fechado os olhos a fatos graves.
Entre os episódios, Viganò dizia que havia custos
exorbitantes para alguns trabalhos, como os 550 mil euros para o presépio de
2009 na Praça de S. Pedro. No ano seguinte, o custo foi reduzido em 200 mil
euros.
Ou as flores que ornamentam as cerimônias, cujo
principal fornecedor, Marco Simeon, da cooperativa Il Cammino, seria amigo de
Bertone.
Em 2009, o Governatorato tinha um prejuízo de quase
oito milhões de euros. Em 2010, com Viganò, o organismo registrou um superávit
de 34.451 milhões de euros.
Viganò pagou as denúncias com o fato de não ser nomeado
cardeal, no consistório de Fevereiro deste ano. O próprio Bertone teria
prometido o lugar a Viganò, mas terá retrocedido depois. O núncio em Washington
era, entretanto, atacado em vários artigos anônimos no Il Giornale. Numa das
cartas ao Papa, o arcebispo dizia-se vítima de "conjura" e pedia um
processo para averiguar se errara.
O banco
Esta "Operação Mãos Limpas" no Vaticano, como
começou a ser designada, incluiu ainda intervenções no Instituto das Obras da
Religião, o banco do Vaticano. Pela primeira vez na história, em Dezembro de
2010, o Papa criou uma Autoridade para a Informação Financeira, que tem como
missão garantir mais transparência nas finanças e combater o crime econômico, o
que foi visto como uma forma de controlar melhor o IOR.
Dos Estados Unidos chegou outra má notícia: em Março, o
relatório do Departamento de Estado sobre tráfico de droga no mundo colocava o
Vaticano entre 68 Estados susceptíveis de serem atingidos de forma
"preocupante" (o segundo de três níveis) pelo branqueamento de
capitais a par de Portugal ou Polônia.
Notícia positiva, nesta área, tem sido o entendimento
com o novo Governo italiano: pressionado pela crise do sistema financeiro, o
primeiro-ministro, Mario Monti, quis acabar com algumas benesses que a Igreja
tinha no sistema fiscal. As negociações têm decorrido de forma pacífica, com o
Vaticano e a Conferência Episcopal Italiana a aceitarem que qualquer
instituição religiosa com atividade comercial pague impostos. De fora ficarão
escolas e colégios e edifícios destinados ao culto.
O delírio
Para ajudar à confusão, soube-se também no início de
Fevereiro que o cardeal colombiano Castrillón Hoyos, ex-presidente da
Congregação para o Clero e considerado um dos mais cardeais mais conservadores,
entregara ao Papa uma nota reproduzindo alegadas inconfidências do arcebispo de
Palermo, cardeal Paolo Romeo. Numa viagem à China, Romeo afirmara a um grupo de
empresários italianos com quem se encontrara que o Papa estaria morto até final
deste ano.
A nota dava a entender a existência de uma conspiração,
mas não foi levada a sério por ninguém. O porta voz do Vaticano, sem desmentir
a sua existência, referiu-se ao conteúdo como "delirante". Mas outro
observador comenta: "Qualquer pessoa, ainda mais com 85 anos, pode morrer
de um momento para o outro. Criar a ideia de um complot contra o Papa, de
forças ocultas como a Máfia ou a Maçonaria, ajuda a criar um fenômeno de
idolatria à sua volta." Segundo algumas notícias, o próprio Romeo
apresentava-se como um dos dois interlocutores privilegiados do Papa o outro seria
o atual arcebispo de Milão, Ângelo Scola, que Bento XVI já teria escolhido como
sucessor predileto. Se a história é delirante, a sua existência revela que há,
pelo menos, quem se entretenha bastante com estes jogos de poder.
Os abusos
A viagem de Bento XVI ao México e a Cuba foi um
bálsamo, mas não ficou isenta de polemicas marginais.
No México, ela sucedeu porque o Papa não se encontrou
com vítimas de abusos sexuais do clero. E se havia país onde isso era
simbolicamente importante, esse país era o México.
Foi ali que nasceu o padre Marcial Maciel Degollado,
fundador dos Legionários de Cristo, acusado de abusos sobre vários menores,
além de se ter relacionado com pelo menos duas mulheres, de que resultaram três
filhos.
Normalmente, é a conferência episcopal do país que pede
e prepara os encontros do Papa com vítimas, justificou o porta-voz do Vaticano,
padre Federico Lombardi. Mas os bispos mexicanos seriam favoráveis ao encontro
e o próprio Lombardi defenderia a sua realização. Terão sido alguns responsáveis
da Cúria a opor-se.
"Provavelmente, o Papa ou alguém por ele não quis
tocar no vespeiro", comenta um observador. Quando era cardeal, Ratzinger
insistiu para que o processo contra Maciel fosse adiante. Mas, na última fase
do pontificado de João Paulo II, quando o Papa já estava muito doente e não
controlava a Cúria, a investigação ficou quase parada.
Pelos 80 anos de Maciel, em Março de 2000, uma missa na
basílica de S. Paulo Fora de Muros, em Roma, contava com a presença do então
secretário de Estado do Vaticano, cardeal Ângelo Sodano, e do secretário
pessoal de Wojtyla, o agora cardeal Stanislaw Dziwisz que várias notícias
publicadas em jornais italianos já identificaram como alguns dos apoios de
Maciel no Vaticano. Foi já com Bento XVI como Papa que o fundador dos
Legionários acabou suspenso das funções de padre e remetido a uma vida de
oração e penitência, até morrer, em 2008.
A questão da pedofilia tem marcado decisivamente o
pontificado de Bento XVI. Ratzinger, criticado por alegadamente não ter agido
contra padres acusados de abusos, só no final do pontificado de João Paulo II
passou a ter poder para fazê-lo. Desde que foi eleito Papa, quis limpar a casa,
tomando uma série de medidas e, ao mesmo tempo, encontrando-se com pequenos
grupos de vítimas em diferentes países.
De tal modo o Vaticano pôs em marcha medidas contra os
padres pedófilos que há já quem considere que se está perante alguns exageros.
"A questão foi muito manipulada por alguma
imprensa e muito mal administrada pelo Vaticano, que transformou 99% dos padres
em delinquentes", diz um outro responsável. "O que se está a pôr em
prática é o reino do terror, com processos rapidíssimos de dois meses, dando
ouvido a denúncias anônimas." Uma das últimas iniciativas foi uma cimeira
realizada em Fevereiro, precisamente para debater estratégias de combate à
pedofilia. O Papa enviou uma mensagem aos participantes no encontro que juntou acadêmicos,
psicólogos, responsáveis católicos e outros especialistas, dizendo que os casos
de abuso são uma "tragédia" para a Igreja e que a atenção às vítimas
deve ser uma "preocupação prioritária". No final do encontro, foi
anunciada a criação de um centro para a proteção da infância.
Em Março, uma comissão de inquérito do Vaticano saudou
os esforços dos responsáveis da Igreja na Irlanda, particularmente atingida
pelo caso. Mas notava que havia ainda "muitas feridas abertas" e que
muitos padres se sentiam "injustamente desacreditados", por serem
associados aos crimes de pedofilia.
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