Os cortes em ciência condenam o
país ao subdesenvolvimento; a aversão dos economistas por tecnologia,
preferindo fazer o país pagar royalties, é desastrosa
Em relação ao ano de 2011, o orçamento federal de 2012 para o
setor de ciência e tecnologia teve um acréscimo de cerca de 20%.
Ou seja, o orçamento de 2012, que aparentemente apresenta um ganho
de 20% com relação a 2011, apenas restaura o valor de 2010. Fomos iludidos.
Pois bem, não bastasse esse logro, a administração atual impôs um
corte de 22% no orçamento do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação. Como
70% desses recursos se referem a custos fixos (salários, impostos etc.), pouco
ou nada resta para os projetos, mesmo aqueles que já estão em andamento.
Isso terá como consequência a existência de perdas não só de
tempo, mas até mesmo de investimentos já realizados.
É interessante notar a diferença entre educação, que não teve
cortes, e o setor de ciência e educação. Nenhum cidadão consciente proporia
cortes em educação. Mas é bom notar que, se educação tem consequências
imediatas, algo que se exprime no acesso ao emprego, a ciência e a tecnologia
representam o desenvolvimento econômico e social futuro do país.
A forte correlação entre o investimento em pesquisas e PIB per
capita das nações é prova suficiente.
Mas de quem seria a culpa senão de David Ricardo (1772-1823), com
seu "teorema dos custos comparativos"? Essa é a única doutrina sobre
a qual todos economistas, exceto talvez Arghiri Emmanuel, estão de acordo. Mas
ela, não obstante, é obtusa.
Explico-me. De acordo com essa teoria, se o Brasil produz soja a
custos menores que o Japão e o país asiático produz eletrônica a custos menores
que o Brasil, então o ganho global será maior se o Brasil se concentrar na
produção de soja -e se o Japão se dedicar à eletrônica.
Adotando-se essa doutrina para todos os itens de troca
internacional, o Brasil estará sendo condenado indefinidamente à produção de
itens de baixo valor agregado, ou seja, ao subdesenvolvimento.
Isso acontecerá inexoravelmente se o Brasil continuar sendo
impedido de realizar pesquisas.
Diz-se que Mário Henrique Simonsen, o gênio, teria argumentado:
"Se pagamos apenas US$ 200 mil de royalties, então para que gastar com
pesquisas em ciência e tecnologia?".
Hoje, pagamos US$ 10 bilhões de royalties. Mas isso é apenas a
ponta do "iceberg".
A consequência desastrosa da aversão que os economistas
tradicionalmente sentem por tecnologia é a incapacidade que tem o Brasil hoje
(e, pelo jeito, continuará tendo no futuro) de competir no campo de manufaturados
e outros produtos de alto valor agregado, por falta de competência tecnológica.
Mantega imita Simonsen, para a desgraça do Brasil.
Enquanto na China 80% dos cargos de decisão são ocupados por
engenheiros, no Brasil são economistas, quando não advogados, que decidem.
Talvez esse fato explique o desenvolvimento modesto do Brasil em
comparação com o da China.
ROGÉRIO CEZAR DE CERQUEIRA LEITE, 80, físico, é professor emérito
da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), membro do Conselho de Ciência e
Tecnologia da República e do Conselho Editorial da Folha.
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