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A crítica literária no amadurecimento de Sérgio Buarque

Enviado por luisnassif,
09/04/2011


Do Portal Luís Nassif


Embora o historiador Sérgio Buarque de Holanda seja um dos maiores intelectuais do século 20, pouco material analítico e crítico foi produzido sobre seus livros publicados após “Raízes do Brasil”, obra de estreia escrita por ele em 1936. Por este motivo, o pesquisador Thiago Lima Nicodemo desenvolveu em sua tese de doutorado um estudo sobre as obras de Sérgio Buarque como crítico literário e historiador da literatura nas décadas de 1940 e 1950.

Crítica literária foi fundamental no processo de amadurecimento do próprio historiadorSegundo Nicodemo, “ler Sérgio Buarque de Holanda vai muito além do livro ‘Raízes do Brasil’. Com o passar do tempo seus textos vão se tornando mais especializados, ao mesmo tempo que contam a história de maneira sensível, atenta ao cotidiano e à mentalidade da sociedade na época.” Isso, segundo o pesquisador, pode ser observado em obras como Monções (1945) e Caminhos e Fronteiras (1957), mas também está presente em sua intensa atividade como crítico literário nos anos 1940 e 1950.


Com ênfase em três momentos específicos, a pesquisa se desenvolveu, em um primeiro plano, sobre textos publicados em jornais brasileiros na década de 1940. Na segunda parte, Nicodemo buscou compreender e interpretar os textos produzidos pelo historiador enquanto este foi docente na Univesità de Roma, entre 1952 e 1954. Por fim, uniu a todo este estudo, uma análise sobre a evolução do pensamento de Buarque nos anos 1950.


Dois aspectos, no trabalho, foram significativos: o new criticism e a produção sobre “uma” história colonial brasileira.


New criticism

O new criticism, tema recorrente dos textos jornalísticos do historiador, consiste em uma nova corrente literária das décadas de 1930 e 1940. Difundida nos EUA e na Inglaterra, buscava deixar de lado as opiniões do autor e todo o contexto social, para simplesmente analisar a obra, suas características de estilo, forma e vocabulário.


Sérgio Buarque de Holanda considerava o new criticism como um movimento conservador, preocupado exclusivamente com a estética. Porém, percebeu que este movimento estava inserido no momento histórico e, mesmo sendo contrário a ele, como historiador, não poderia deixar de estudá-lo e mesmo aproveitá-lo em suas análises”, comenta o pesquisador, salientando a mudança de opinião do historiador em relação ao movimento.


Sérgio Buarque pode ser considerado o introdutor dessa corrente de interpretação literária no Brasil. Elementos do “new criticism” podem ser encontrados em suas análises da poesia contemporânea brasileira, em seus textos sobre Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, João Cabral de Melo Neto, dentre outros.


Uma história colonial brasileira

A segunda etapa da pesquisa se baseia em textos e anotações em livros feitas pelo historiador enquanto esteve na Università de Roma. O objetivo de sua presença lá era ministrar aulas e palestras que possibilitassem a inserção de uma cátedra sobre Estudos Brasileiros em vários países europeus.

É nesse tempo em que ele, com um amplo aparato de pesquisa, passa a desenvolver textos ainda mais ricos em que tenta formalizar uma identidade nacional.


O pesquisador cita , por exemplo, que ao analisar o ressurgimento do Barroco na década de 1950, em seu livro “Visão do Paraíso”, o historiador mostra a necessidade de se formar uma identidade nacional. “O Barroco, na opinião da elite, seria o movimento artístico mais adequado a demonstrar a tradição, riqueza e opulência da sociedade brasileira”, ressalta Nicodemo.

“Sérgio Buarque vai muito longe em sua forma de entender a história. Liga, por exemplo, a tradição religiosa europeia a relatos de viajantes e demonstra como a imagem do paraíso foi fundamental para a dominação.”

O estudo desenvolvido na Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, sob a orientação da professora Raquel Glezer trouxe como lição mais importante, segundo o pesquisador, a ideia de que “a história tem de ser vista por um viés crítico para poder produzir identidades. Por meio dela, podemos nos conhecer melhor, saber como houve a formação de nossa identidade e refletir sobre os dilemas do Brasil hoje”.

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